domingo, 24 de novembro de 2013

Pico do Muquém e Pico da Bandeira (Carvalhos-MG) - nov/13

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/CarvalhosMGPicoDoMuquemPicoDaBandeiraECachoeirasNov13.

O Pico do Muquém, o Pico da Bandeira e o Pico do Calambau formam a tríade de montanhas irmãs do município de Carvalhos, sul de Minas Gerais. Desde que os avistamos pela primeira vez durante uma travessia na Serra do Papagaio, esse conjunto despertou a nossa atenção e procuramos logo saber como chegar a eles e se haveria trilha para os cumes. Nesse último feriado o velho projeto foi colocado em prática.

PICO DO MUQUÉM
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Após uma noite de merecido descanso do estresse causado pelo enorme congestionamento de feriado, saímos eu e o Ronald da pousada Pico do Muquém, em Carvalhos, às 8h10 e nos dirigimos ao bairro do Muquém, a 8,3km da cidade, para obter informações sobre a subida do Pico do Muquém, nosso primeiro objetivo. Não há dificuldade para chegar aos bairros rurais do município pois há placas indicativas na saída da cidade e nas bifurcações todas. No bairro do Muquém os moradores nos deram duas alternativas: tomar uma estrada ali mesmo, ao lado do laticínio, e seguir até um sítio onde deveríamos deixar o carro e seguir a pé por causa das más condições da estrada; ou voltar 6,6km e, numa das bifurcações sinalizadas, rumar para o bairro Ponte Alta, com a estrada em melhores condições e a possibilidade de chegar mais perto da base do pico com o carro.

Escolhemos a segunda opção. Desde a bifurcação do bairro Ponte Alta até a igrejinha do local rodamos 2,4km, depois mais 1,2km até uma bifurcação em que as duas ramificações terminariam em poucos metros em algum sítio ou fazenda. Deixamos o carro nessa bifurcação às 9h22 e seguimos a pé pela estradinha estreita da esquerda, exatamente na direção do pico. Cruzamos a primeira porteira e antes da segunda tomamos uma trilha no pasto à esquerda, começando a subir. Essa trilha bem marcada nos levou a um selado com uma pequena porteira. Como dali em diante a picada desceria para a outra vertente, ganhamos o pasto à direita e subimos sem trilha, sempre de olho no pico. Cruzamos uma cerca por baixo e continuamos subindo (ainda sem trilha) pelo capim e lajes de pedra na direção de uma matinha no topo. Parte do bairro do Muquém já se tornava visível à esquerda, bem abaixo no vale. A matinha era rala a princípio e uma trilha ajudou a avançar na direção desejada, ou seja, sempre para cima e na direção do enorme rochoso do Muquém. A mata tornou-se mais espessa e a trilha nos levou diretamente a uma cerca, que cruzamos também por baixo. O pasto a seguir estava viçoso e com o capim ligeiramente mais alto. Seguimos sem trilha de novo tendo uma cerca à esquerda até o momento certo de cruzá-la e tomar a crista final para a base do pico. Para nossa surpresa a cerca era dupla, mas num determinado ponto o arame não era farpado e foi mais fácil a travessia por baixo ou por cima.

No capim a seguir não havia uma trilha nos primeiros metros, mas tomando a direção da crista (à direita) logo apareceu uma picada bem definida que nos levou morro acima. Nessa subida uma visão surpreendente: dois veados andavam ali pela mata da base do pico, porém ao nos ver fugiram para o alto e desapareceram.

Essa trilha, como disse, sobe pela direita do pico e leva diretamente à sua face oeste, a única acessível sem equipamento já que todos os outros lados do rochoso são altas paredes a pique. Atingida a base junto à face oeste às 11h, a visão já é espetacular, com uma série de montanhas do lado sul despontando.

Mas agora é que a aventura ia começar: a escalaminhada da parede do pico até seu cume. Como essa montanha é relativamente frequentada, já existe um caminho marcado nessa subida bastante íngreme. O lance que exige mais cuidado é uma laje de pedra inclinada (quase vertical) de uns 6 metros de altura com apoios ruins e bastante exposta à altura do lado esquerdo. Passado esse ponto de adrenalina basta subir embalado que o cume está logo ali. Chegamos a ele às 11h23 e o gps registrou a altitude de 1695m.

A visão do topo é magnífica já que o Pico do Muquém é um dos mais altos do município. O bairro Ponte Alta, onde deixamos o carro, ficou a nordeste, assim como a cidade de Carvalhos. A sudeste o bairro do Muquém, agora totalmente visível, com destaque para sua igreja. Os picos irmãos do Muquém estão ao sul (Bandeira) e a noroeste (Calambau), chamando a atenção a enorme parede de pedra da face norte do Bandeira, este uns 30m mais alto que o Muquém. E para além do Bandeira, bem distante, distinguem-se a Mitra do Bispo e a Serra do Ouro Fala, nos limites entre Alagoa e Aiuruoca. A oeste uma visão bastante diferente do Pico do Papagaio e toda sua serra. Para completar a panorâmica, dois biquinhos despontam sobre as serras ao sul: é a Pedra Selada de Visconde de Mauá.

Permancemos no cume cerca de uma hora, recolhemos o pouco de lixo que havia e iniciamos a descida às 12h26. A passagem pela laje mais alta não teve grandes riscos e foi tranquila. Refizemos exatamente o mesmo caminho na volta, cruzamos as três cercas e descemos pelo pasto até a porteira pequena do selado. Como mencionei, dali em diante a picada que vem do bairro Ponte Alta desce para a outra vertente, a do bairro do Muquém. O Ronald deveria voltar à Ponte Alta para pegar o carro, mas eu gostei da sua sugestão de explorar esse outro lado da serra e verificar as condições da estrada, precária segundo os moradores com quem conversamos.

Nos separamos às 13h40 e não desci nem 300m que já cruzei um colchete junto a uma casa. Logo abaixo atravessei a porteira de arame farpado da entrada do sítio e peguei água no riachinho ao lado (a única água do dia). Em seguida uma casa grande em construção, uma estrada seguindo para a direita que ignorei (por supor levar a algum sítio) e uma estrada "principal" correndo à esquerda. Se a tomasse à esquerda voltaria para o bairro Ponte Alta, então fui para a direita. Ela sobe um pouco e tem um pouco de pedras soltas, mas com tempo seco é viável para qualquer carro. Passei por uma porteira às 14h10 e fui para a esquerda na bifurcação seguinte. Vários outros sítios, vacas no meio da estradinha, mais duas porteiras e às 14h34 estava de volta ao bairro do Muquém, exatamente na esquina do laticínio, como haviam nos informado. Concluí que essa estradinha, apesar de duas pequenas ladeiras com algumas pedras, seria acessível a qualquer carro em condições de tempo seco. Porém, para quem está em Carvalhos, o caminho mais curto até o Pico do Muquém certamente é pelo bairro Ponte Alta. O acesso pelo bairro do Muquém seria conveniente para quem está em Aiuruoca e se dirige a Carvalhos pelas estradas vicinais que ligam as duas cidades, passando pelo bairro Três Irmãos.

PICO DA BANDEIRA
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Sem demora, partimos para a segunda montanha do dia, o Pico da Bandeira, o irmão do Muquém mais ao sul.

Do bairro do Muquém seguimos de carro na direção do bairro Três Irmãos (sudoeste), tomando a direita na primeira bifurcação e parando um instante na segunda bifurcação, cerca de 800m após o bairro, onde uma placa indicava Três Irmãos e Aiuruoca à direita e Bananeira à esquerda. Estávamos exatamente no pé da longa crista que tem como cume o Pico da Bandeira e seguimos para a esquerda. Rodamos 2,1km e deixamos o carro em frente a um ranchinho de madeira que serve como depósito, próximo a uma casa antiga abandonada.

Dali às 14h55 cruzamos um colchete do lado direito da estrada (para quem vem do Muquém) e atravessamos uma área de terra com uma plantação de milho que ainda começava a brotar. Mais um colchete e começamos a subir a encosta de pasto à esquerda (oeste) sem trilha a princípio. Logo uma trilha bem definida aparece na direção desejada e nos leva diretamente à mata densa que recobre toda a encosta mais alta dessa serra. Surpreendentemente, a trilha continuava bem aberta e marcada por dentro da mata, o que indicava que estávamos no caminho certo e as chances de sucesso, apesar do horário avançado, aumentavam.

Bem, a trilha subiu sem erro até alcançar uma área de mata mais aberta e muitas samambaias jovens espalhadas pelo capim. Ali ela sumiu. Como o avanço seria fácil (até o dia em que essas samambaias tomarem conta de tudo), tocamos para cima procurando alguma continuação da picada, o que aconteceu uns 200m acima, onde ela corre da esquerda para a direita. Prosseguimos para a direita, atravessamos um colchete e alcançamos a crista às 15h30. Dali a trilha continua em frente, toma a direita e começa a descer suavemente. Mas o cume do Bandeira estava à nossa esquerda (e ainda havia um desnível grande até seu topo). Abandonamos essa trilha que tendia a descer e tomamos uma outra trilha à esquerda, bem na direção do cume, porém ela parecia menos usada e logo começou a sumir no meio da vegetação mais fechada. Tivemos que procurar sua continuação varando o mato para os lados. Encontramos mais um pedaço dela e saímos desse trecho mais fechado para uma matinha mais baixa e rala, onde também a trilha não estava definida mas a visão do pico nos dava a direção, ou seja, tendendo à esquerda já que à direita a inclinação era quase vertical. Aos poucos saímos da matinha espaçada e atingimos a encosta de capim do pico. Por sorte havia um rastro de capim amassado que facilitou a subida final, um pouco longa e íngreme. Atingimos enfim o cume do Pico da Bandeira às 16h18 verificando que pela sua altitude (1726m) ele era realmente mais alto que o Muquém (31m).

A visão é igualmente espetacular, com o Pico do Muquém ao norte e o bairro homônimo a leste. Ao sul, tivemos uma visão ainda mais nítida da Pedra Selada, da Mitra do Bispo, da Serra do Ouro Fala e até da Serra do Capoeirão, rasgada pela estrada que liga Alagoa a Itamonte, sempre bem destacada pelos enormes barrancos vermelhos. À direita dela pudemos distinguir bem no horizonte o Pico do Garrafão.

Percorremos o cume, que se alonga no sentido leste-oeste, e permanecemos pouco mais de uma hora, quando as chuvas avistadas ao longe começaram a se aproximar. Iniciamos a descida às 17h24 pelo mesmo caminho e chegamos ao carro às 18h55. Dali foram 11km de volta a Carvalhos.

Informações adicionais:

Cartas topográficas:
. Alagoa - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-A-I-2.jpg
. Liberdade - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-A-II-1.jpg

Observação: na carta topográfica do IBGE, os picos aparecem com outros nomes. O Pico do Muquém está como Morro Grande, o Pico da Bandeira é Morro do Mato Grosso e o Pico do Calambau vem registrado como Morro da Ponte Alta.

Rafael Santiago
novembro/2013

Percurso na imagem do Google Earth

Percurso na carta topográfica

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Travessia do Campo dos Padres e Cânion do Espraiado (SC) - abr/13

ImagemTorre na ponta oeste do Cânion do Espraiado

O tracklog desta travessia está em www.mochileiros.com/travessia-do-campo-dos-padres-e-canion-do-espraiado-sc-t83925.html.

Esse extenso relato descreve uma travessia pelo setor norte da Serra Geral, começando no povoado de Pedra Branca (município de Alfredo Wagner-SC), passando pelo Campo dos Padres e Cânion do Espraiado e terminando no belo vale do Rio Canoas, a 30km do centro de Urubici-SC.

Levei oito dias para completar esse roteiro pois não conhecia o caminho e tinha relatos e tracklogs apenas de alguns trechos. A ligação entre esses trechos foi feita através de caminhos desenhados no Google Earth e gravados no gps. Mas na hora H valeu muito a navegação visual também, e para isso tive muita sorte com o tempo, com quase todos os dias limpos e abertos. Porém nada disso me livrou de alguns caminhos errados, o que me fez perder bastante tempo. Explorações de possíveis atalhos e outras trilhas também me tomaram um tempo considerável.

Certamente é possível fazer esse roteiro em menos tempo tendo o tracklog completo e correto na mão. Ou ainda eliminando algum local (ou mais de um) do roteiro que signifique um desvio na rota principal.

Antes de partir para o texto, é bom saber que:
. as estradas que cito a partir do segundo dia são na maioria restos de antigas estradinhas, todas abandonadas e sem a menor possibilidade de trafegar carro ou mesmo 4x4 pois são muito precárias e em algum ponto estreitam e viram trilha

. as trilhas são na maioria caminhos abertos pelo gado que pasta pelos campos de cima da serra já que todo esse percurso que descrevo está dentro de grandes fazendas

. as poucas casas e currais que vi pelo caminho estavam desertos, não encontrei uma alma viva a partir do segundo dia (exceto alguns boiadeiros com quem cruzei rapidamente no 4º dia), mas vi algum gado pastando

. os nomes de rios e riachos que coloco no texto são baseados nas cartas topográficas do IBGE (links abaixo, nas informações adicionais) e podem não bater com as denominações dadas pelas pessoas da região ou podem mesmo estar incorretos

1º DIA: DO TREVO DE LOMBA ALTA AO SOPÉ DO MORRO DA PEDRA BRANCA

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC1DiaAbr13.
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Paredões do extremo norte da Serra Geral

Na rodoviária de Floripa peguei o ônibus das 12h da empresa Reunidas para Lages e desci às 14h35 no acesso ao distrito de Lomba Alta, no km 114 da rodovia BR-282, 10km depois da parada em Alfredo Wagner. A única placa de Lomba Alta na estrada fica virada para quem vem de Lages e isso causou uma certa dúvida em mim e no motorista, mas desci no lugar certo. Altitude de 770m. Caminhei pela rodovia mais 270m, cruzando a ponte sobre o Rio São João, e entrei na primeira estrada de terra à esquerda, junto à placa "Pedra Branca".

A estradinha passa por algumas casas aqui e acolá, sobe um pouco e às 15h33 tomo a direita na primeira bifurcação que aparece, subindo um pouco mais e tendo a primeira visão dos paredões do extremo norte da Serra Geral. Vista magnífica! A trilha que sobe esses paredões fica bem no meio do conjunto rochoso e o Morro da Pedra Branca está ligeiramente à esquerda dela. Mas primeiro a estradinha vai percorrer todo o vale do Rio das Águas Frias e depois subir o Rio Santa Bárbara até suas nascentes. Havia muito chão ainda até chegar próximo aos paredões.

Após algumas subidas e descidas, passei por um local onde estava acontecendo um ruidoso e animado rodeio, diversão de fim de semana do povo local, com direito a boi bravo dando trabalho e diversas crianças montadas e vestidas a caráter. Às 16h55 fui à esquerda numa bifurcação e com mais 200m passei pela igreja do bairro Pedra Branca, que fica no alto à direita (Capela de São João, segundo a carta). Logo depois encontrei um ponto de água na estrada, fui para a esquerda em outra bifurcação e passei por mais outra fonte de água (essas águas ficam próximas a áreas de reflorestamento e preferi não pegá-las). Às 17h20 sou surpreendido por uma pousada nesse lugar de tão poucos habitantes, a Hospedaria das Montanhas (48-8412-4383), onde parei alguns minutos para um dedo de prosa. Menos de 200m depois alcanço o pequeno cemitério gramado do vilarejo.

Até aqui percorri o vale do Rio das Águas Frias. Uns 50m depois de uma ponte de madeira (sobre o Rio Santa Bárbara), fui para a direita na bifurcação às 17h39 e adentrei o vale do Rio Santa Bárbara, um dos formadores do Águas Frias. Cruzei uma porteira, uma casa de madeira vazia à esquerda e logo passo a caminhar pela margem direita do pedregoso Rio Santa Bárbara, por um gramadão com cavalos e vacas. Na porteira seguinte uma placa: "Propriedade particular - acesso mediante autorização do proprietário", que ignorei. Na próxima bifurcação fui para a esquerda pois a direita leva diretamente a algumas casas. Na porteira seguinte, às 18h12, a noite já caía e tratei de arranjar um espaço plano no gramado que margeia o rio para montar a barraca. Do local onde acampei podia ver os paredões claros do Morro da Pedra Branca. Altitude de 887m.

Nesse dia caminhei 12,9km.

2º DIA: DO SOPÉ DO MORRO DA PEDRA BRANCA AO EXTREMO NORTE DO CAMPO DOS PADRES

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC2DiaAbr13.

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Paredões do vale do Rio Santa Bárbara

Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 7h58. Com 200m me deparo com um galpão à frente mas a estradinha continua subindo à esquerda dele. Estradinha essa que vai se tornando um gramado ralo e se transformando numa trilha. Às 8h27 um grande portão de ferro trancado e uma nova placa tentam intimidar quem pensa em passar: "acesso restrito ao proprietário e funcionários - não insista!". Mas insisti. Na bifurcação seguinte fui para a direita, cruzei um riacho, me mantive na esquerda na próxima bifurcação e cruzei mais dois riachos espantando as vacas que estavam por ali sossegadas. Na subida pelo pasto após esse último riacho a trilha desapareceu no capim e me aproximei da mata à frente para tentar encontrar a continuação. Não havia trilha batida ali no final do pasto, então voltei um pouco na direção do riacho e encontrei a trilha à direita, bastante discreta (nas fotos do Picasa fiz uma marcação do início dela). A trilha logo entra na mata e é larga e batida, correndo bem próxima a um riacho (à esquerda) que é um dos tributários do Rio Santa Bárbara.

Água nesse início de dia não foi problema (embora a presença do gado a torne meio suspeita), porém é melhor abastecer todos os cantis nesse riacho pois a subida é cansativa e a água só reapareceu para mim no final do dia.

Após uma cerca começou às 10h22 a tão aguardada subida da Serra Geral, feita em ziguezagues, na cota dos 1178m. À medida que ganho altitude a visão do caminho percorrido e das escarpas da serra vai se ampliando, cada vez mais bonita. Até que às 11h16 me deparo com uma cerca improvisada de troncos e galhos, nos 1480m. Atravessei-a pensando que o caminho para o Campo dos Padres continuasse depois dela, mas não. Ao cruzá-la atingi a borda da serra, com visual de 360º de tirar o fôlego, e o que encontrei à frente foi o caminho para o Morro da Pedra Branca, que fica à esquerda (norte) de quem sobe a serra. O Campo dos Padres fica ao sul. Como o topo do Morro da Pedra Branca não estava muito perto, descartei a idéia de subi-lo e passei a procurar uma trilha para o lado oposto (sul).

Eu estava na beirada da serra e podia ver os imensos paredões da face leste da Serra Geral, mas e a trilha para chegar a eles? Voltei até a cerca de troncos, cruzei-a de volta e percebi uma trilha quase fechada pelas plantas saindo para a esquerda. Entrei nela e galguei uma crista florestada que me lançou às 12h08 num extenso campo, o extremo norte do Campo dos Padres, finalmente. Altitude de 1553m. Ali, próximo aos paredões, tive meu primeiro contato com o urtigão-da-serra (Gunnera manicata), uma planta impressionante, de folhas imensas, nativa da Serra Geral. E também não demorei muito a rever as famosas turfeiras, nome local para um tipo de vegetação rasteira, "esponjosa", que acumula água e é o terror de quem caminha pelos altos da serra catarinense e gaúcha por significarem botas e pés molhados.

Os grandes campos de cima da serra parecem a distância locais fáceis de caminhar, mas não é bem assim. Quase sempre são terrenos úmidos ou mesmo alagados, o que causa uma certa dificuldade e cansaço. Junto à borda da serra, na parte mais alta dos campos, costuma ser mais fácil andar pois o solo é menos encharcado e há até trilhas abertas pelo gado que pasta solto ali.

Pois bem, atingido o alto da serra passo a caminhar pelo campo sempre próximo à beirada dos paredões e aos focos de mata (pelos motivos acima). O primeiro morrinho que surgiu tentei transpor por cima, mas a vegetação fechou no alto. Voltei e o contornei pela direita mas dei de cara com um precipício. Voltei devagar contornando o morro novamente e encontrei às 16h33 um caminho bem largo à direita, bem junto ao pé do morro. Largo, encharcado e enlameado, um corredor entre as árvores que me lançou em outro campo onde o abismo de um pequeno cânion me obrigou a ir para a direita, encontrando um longo muro de pedra. Cruzei-o por um colchete e comecei a subir o alto morro à frente. A certa altura dessa subida a trilha se divide. Tentei primeiro à direita mas topei com mata fechada, voltei e fui para a esquerda, terminando a subida do morro e reencontrando água logo a seguir, às 17h49. Como sempre, para diminuir o esforço da caminhada fui em direção a um foco de mata junto à borda da serra, a leste. Pelo horário, já estava na hora de montar a casa. Altitude de 1649m.

Nesse dia caminhei 9,7km (já excluídos os caminhos errados que tomei e tive de voltar)

3º DIA: DO EXTREMO NORTE DO CAMPO DOS PADRES AO MORRO DO CHAPÉU (OU MORRO DA BELA VISTA DO GHIZONI)

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC3DiaAbr13.

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Morro do Chapéu (ou Morro da Bela Vista do Ghizoni)

Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 7h46. Tinha um novo morro pela frente e sem muita certeza da direção a seguir quando estivesse no seu topo. Atravessei todo o cansativo campo de turfa até ele, com uma parada para descansar junto a uma fonte de água no caminho. Atingi o sopé do morro bem abaixo de uma faixa de capim que descia do topo, por onde subi e segui uma trilha de boi para a esquerda, subindo mais. Assim, no alto, às 9h22, tive a primeira visão do Morro da Bela Vista do Ghizoni, ou Morro do Chapéu (conhecido pelo formato de seio de mulher), e do Morro da Boa Vista à direita dele, respectivamente terceiro e primeiro pontos mais altos do estado de Santa Catarina (segundo o Anuário Estatístico do Brasil 2012, do IBGE - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/20/aeb_2012.pdf). Porém entre mim e eles havia o imenso cânion do Rio Kuhl, cujo vértice fica do lado esquerdo.

Fui então para a esquerda (leste) e comecei a procurar algum caminho na mata do meu lado direito que me levasse na direção do vértice desse grande cânion. Acabei encontrando um totem de pedras que sinalizava uma trilha de vacas que descia e adentrava a mata. Ótimo! Mas antes aproveitei a proximidade do Morro Perdido (assim chamado no site Wikimapia) e fui subi-lo, bastando continuar no sentido leste/nordeste. No topo, às 10h20, encontrei um marco geodésico e o penhasco da borda da Serra Geral. 1760m de altitude.

Porém gastei mais de uma hora ali na expectativa de a neblina se dissipar para ter uma paisagem melhor para as fotos e poder navegar visualmente, planejando o melhor caminho até o Morro do Chapéu entre campos e focos de mata. Só às 11h40 voltei ao totem e entrei na trilha que me levaria ao vértice do cânion. Ela está bem marcada pela passagem das vacas mas com a vegetação um pouco fechada, com muitas samambaias num certo trecho. Saí da mata às 12h17 e me aproximei da beirada da serra (à esquerda) novamente para mais fotos, agora com neblina zero. Acompanhei a borda por uma trilha e cheguei às 13h08 a um muro de pedra pequeno onde desci, atravessando um trecho de mata de pouco mais de 100m sem dificuldade. Lá embaixo mais um campo de turfeira me esperava. Procurei contorná-lo pela esquerda, mas não era melhor do que pelo meio, ou seja, tudo afundando e encharcado mesmo. Só ao me aproximar da beirada do paredão é que encontrei um caminho seco.

No alto à minha frente visualizava uma longa crista que deveria subir para alcançar o Morro do Chapéu, que se eleva na extremidade direita dela. Mas para chegar lá parei um pouco para estudar o melhor caminho entre as extensas faixas de mata da encosta dessa crista. Subi ao primeiro platô pela única passagem existente e prossegui para a direita em nível por um 400m, passando por três fontes de água (as últimas desse dia). Voltei a subir forte à esquerda por uma língua de capim baixo que descia do topo, seguindo em parte trilhas de vaca.

Às 15h26 alcanço o alto da longa crista (do Morro do Chapéu) e continuo caminhando em direção ao outro lado dela, onde passo a ter visão de um novo e imenso vale e de mais uma porção da borda da Serra Geral, um pouco mais ao sul, com predomínio de campos, pastagens e alguns morros, incluído aí o Morro do Campo dos Padres (1790m). Mas o que me chama mesmo a atenção nesse momento são os gritos de um boiadeiro direcionando o gado já que não via ninguém desde a tarde do primeiro dia da travessia. Esse local é o vale do Rio Campo Novo do Sul, mas ainda não conseguia ver o rio propriamente dito, teria de caminhar mais um pouco para sudoeste para conseguir vê-lo serpenteando lá embaixo.

Tomei a direção do Morro do Chapéu (lembrando aqui que eu já estava na crista dele) e mais no alto pude ver às 16h06 uma casa de fazenda bem aos pés do Morro do Campo dos Padres, e também o Morro da Boa Vista a sudoeste.

Aproximei-me do Morro do Chapéu, terceiro ponto mais elevado do estado, e o contornei pela esquerda, não o subi. Ao contorná-lo me aproximei da beirada dessa crista e pude visualizar lá embaixo as curvas do Rio Campo Novo do Sul, cortado pela estradinha precária que leva à casa da fazenda.

A seguir eu deveria descer até essa estradinha, caminhar um pouco por ela na direção da casa e subir a crista seguinte tendo como objetivo o Morro da Boa Vista. Havia ainda cerca de uma hora de luz natural mas resolvi parar ali no alto mesmo pois corria o risco de acampar ou me aproximar muito da casa da fazenda e talvez não ser bem-recebido. Montei a barraca então aos pés da face sul do Morro do Chapéu. Altitude de 1745m.

Nesse dia caminhei 8,8km (na verdade, andei um pouco mais pois tomei alguns caminhos errados).

Importante dizer que a estradinha que avistei continua para oeste e liga a fazenda à cidade de Bom Retiro, servindo portanto como um acesso mais rápido ao Morro do Chapéu ou mesmo uma rota de fuga para essa minha travessia. Mas são 30km dali até Bom Retiro.

4º DIA: DO MORRO DO CHAPÉU (OU MORRO DA BELA VISTA DO GHIZONI) ÀS NASCENTES DO RIO CANOAS

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC4DiaAbr13.

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Morro do Campo dos Padres e Rio Canoas

Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 8h. O meu primeiro objetivo desse dia era o Morro da Boa Vista, que eu podia ver claramente do local onde acampei, porém o imenso vale do Rio Campo Novo do Sul se colocava entre nós. Seria preciso contorná-lo pela esquerda (leste).

Para ter acesso ao vale eu deveria descer toda a encosta sul da crista do Morro do Chapéu, porém toda ela é recoberta de mata. Procurei um local onde a passagem pela mata fosse menos extensa e encontrei uma descida formada de capim baixo com uma faixa mais estreita de árvores abaixo e depois um pasto com cavalos. Fui por ali e cruzei menos de 150m de mata, sem grandes dificuldades. No pasto com cavalos notei que a estradinha vista ontem saía para a esquerda e passei a caminhar por ela (na verdade, ela atravessa o pasto e continua para a direita, sendo o caminho que vai dar na cidade de Bom Retiro e que pode ser uma rota de fuga, como já mencionei).

Mas não andei nem 50m pela tal estradinha precária que fui obrigado a subir o barranco e liberar o caminho pois os boiadeiros vinham na minha direção tocando um grupo grande de vacas e me pediram para sair pois poderia assustá-las. Esse foi o único momento em que cruzei com gente em toda a travessia (sem contar as pessoas do povoado de Pedra Branca, antes de entrar na trilha). Voltei em seguida a caminhar pela estradinha e às 9h05 cruzei o Rio Campo Novo do Sul, largo e raso, saltando pelas pedras. Porém abandonei a estradinha ali mesmo e segui por uma trilha junto ao rio, à direita.

Nesse ponto o terreno por onde o Rio Campo Novo do Sul desliza deixa de ser suave e passa a ter cortes abruptos, prenunciando o estreito cânion que irá emparedá-lo logo abaixo. Nesses cortes lindas cachoeiras despencam de uma altura e tanto. Passei por baixo de uma cerca e logo comecei a subir o morro à direita (sul), tendo como meta a crista do Morro da Boa Vista. Atingido o primeiro platô, contornei o morrinho seguinte pela direita e logo pude ver a casa da fazenda abaixo à esquerda, já ficando para trás. Subi um pouco mais e alcancei a crista que culmina no Morro da Boa Vista a sudoeste. Dessa crista, nova e espetacular visão dos campos e morros mais ao sul, junto à borda da Serra Geral, com destaque para o grandioso vale do Rio Canoas e suas nascentes.

Para o Morro da Boa Vista, bastou continuar subindo pela crista na direção sudoeste até um grupo de grandes pedras, onde deixei a cargueira para o ataque ao cume, um pouco mais ao sul. Vacas pastavam na encosta do Boa Vista, cujo topo alcancei às 11h34. Altitude de 1823m. Dois marcos geodésicos guardam o ponto culminante do estado de Santa Catarina. Dali tinha visão impressionante do vale do Rio Canoas bem junto à borda da Serra Geral a leste, do Morro do Campo dos Padres a nordeste, do Morro do Chapéu e Morro Perdido ao norte, além dos morros e picos da Serra do Corvo Branco, do Parque Estadual da Serra Furada e o Morro da Igreja, bem distantes ao sul.

Notei também uma trilha larga (ou estradinha abandonada) passando logo abaixo do morro e indo para o sul, como uma continuação das trilhas de boi que eu havia pego até ali, e foi para ela que me dirigi ao descer do Morro da Boa Vista, às 12h20. No grupo de pedras onde tinha deixado a cargueira, havia sinal de celular e consegui enviar uma mensagem pela Claro. Depois de um lanche, retomei a caminhada pela trilha larga e bastante encharcada passando às 14h50 por um ponto de água, o segundo do dia, considerando como primeiro o Rio Campo Novo do Sul.

Eu abandonei essa trilha larga logo em seguida mas é importante destacar que ela alcança uma outra estrada de terra 5km à frente, a qual leva a Urubici em mais 36,6km, podendo ser um acesso mais rápido ao Campo dos Padres (já que boa parte dela deve ser trafegável) ou uma segunda rota de fuga dessa travessia.

Como disse, 130m depois da água deixei a trilha larga em favor de um trilho de boi à esquerda que descia até outro riacho já que meu próximo objetivo era chegar ao Rio Canoas. Mais 50m e passo pelos restos de uma antiga cerca, tendo o vértice de um pequeno cânion à esquerda. Procurei o melhor caminho para a descida até o Rio Canoas e encontrei uma trilha de gado que descia na direção de um cocho, mas antes de chegar a ele saí para a direita, diretamente para o Rio Canoas, que alcancei às 16h36. Aqui ele está muito próximo das nascentes porém já é um rio "de respeito", com alguns metros de largura, mas de travessia fácil pelas pedras. A primeira coisa que me atraiu foi o barulho de uma cachoeira e caminhei 50m para a direita para fotografá-la. Aqui também o relevo plano e suave do leito do rio sofre um corte súbito, fazendo-o despencar em forma de bela queda-d'água.

Em seguida subi a encosta de capim e me aproximei da borda da Serra Geral, da qual eu havia me afastado desde a tarde do dia anterior. Com o dia limpo, sem nenhuma nuvem, aproveitei para fotos da paisagem catarinense a se perder no horizonte. Encontrei uma trilha bem marcada correndo junto à borda e segui por ela para a direita (sul), mas às 17h50, com o sol já se escondendo, tratei de arranjar um lugar para dormir. E fiz questão de ficar junto aos paredões para ter a mesma paisagem de manhã, com oportunidade de fotografar tudo de novo com outra luz. Altitude de 1553m.

Nesse dia caminhei 10,7km da travessia propriamente dita (mais alguns desvios para explorações).

5º DIA: DAS NASCENTES À GRANDE CACHOEIRA DO RIO CANOAS

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC5DiaAbr13.

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Vale do Rio Canoas e Morro do Campo dos Padres

Nesse quinto dia me afastei novamente das bordas da Serra Geral e tive como referência o vale do Rio Canoas, tendo o rio ora bem próximo ora um pouco mais afastado. Só retornaria à borda da serra no final do dia seguinte.

Só porque eu pernoitei próximo à borda da serra e seus belos mirantes, o dia amanheceu totalmente encoberto, sem visão nenhuma por causa da neblina. Como eu não tinha pressa e queria fotografar a paisagem, fiquei enrolando na barraca. Quase 10h da manhã o sol deu as caras e começou a dispersar aquele nevoeiro todo. Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 10h42, já com céu limpo, o que me permitiu tirar boas fotos.

Continuei pela trilha bem marcada na direção sul com a beirada dos penhascos à minha esquerda. Logo atravessei um trecho de mata fácil de uns 80m e desci ao vale do Rio Canoas contornando o morro à frente pela direita por trilha de gado. Cruzei um colchete e sem querer botei algumas vacas para correr.

Aproveitei a aproximação do Rio Canoas às 11h53 para pegar água e fazer um lanchinho rápido num local bem agradável. Pelos restos de fogueira que havia ali na margem, não fui o primeiro a ter essa idéia. É que a Trilha dos Índios, um acesso a partir da zona rural de Anitápolis, alcança o Campo dos Padres muito próximo dali. Fica então como dica esse outro caminho, a Trilha dos Índios, que pode servir como um acesso mais rápido ao Campo dos Padres ou como uma terceira rota de fuga dessa travessia.

Continuo pela margem esquerda do Rio Canoas mas me afasto um pouco dele, cruzando alguns riachinhos seus tributários e um colchete logo depois de um cocho. Uns 500m antes de uma casa azul que aparece no meio do nada, subo um morrinho à direita sem trilha para conhecer às 13h05 o antigo cemitério de pedra, que conserva os muros e apenas três cruzes de ferro quase completamente enterradas. Bem bonita a vista dali para o Rio Canoas, na direção das suas nascentes, com o Morro do Campo dos Padres ao fundo.

Desci pelo mesmo caminho e retomei a trilha principal até a casa azul e o grande (e interessante) curral de pedra que a antecede. A casa parecia nova e desocupada, não havia viva alma. A partir dali, caí numa estradinha bem precária, cruzei uma cerca de arame farpado fechando a estrada e às 14h15 desci a encosta gramada do lado direito para me aproximar de uma bela queda do Rio Canoas, com grande poço para banho e bonita vista do vale para leste e oeste.

Continuando, a estradinha virou trilha com os arbustos prestes a fechá-la de vez, sinal de que nenhum tipo de veículo passa mesmo por ali. Quando abriu novamente e voltou a ser uma estradinha, topei às 14h47 com uma bifurcação em T com uma casa à direita, a cerca de 600m, do outro lado do Rio Canoas. Mas fui para a esquerda, caminhando em meio ao pasto com vacas, até que alcancei o final da estradinha, exatamente numa cerca de arame, que cruzei por baixo. Uns 50m à direita vi alguma coisa diferente e fui conferir: era a carcaça de uma espécie de trator pequeno e comprido que se usa na região. Carcomido e enferrujado, estava sendo engolido pelo mato.

Voltando à cerca continuei pela estradinha, que logo virou uma trilha entre as árvores. Uns 300m depois da cerca, às 15h30, surge uma outra trilha descendo à direita e vou explorar (observação: nesse momento saio do caminho da travessia, mas voltarei mais tarde a esse mesmo ponto para continuar). Era uma outra trilha larga (ou resto de estrada antiga) que me lançou de volta ao Rio Canoas, o qual cruzei pelas pedras sem dificuldade, apesar de um pouco largo. Seguiu-se uma subida forte e 250m depois do rio fui à esquerda numa bifurcação. Importante: subindo à direita nessa bifurcação a estradinha precária continua e bifurca de novo: a direita leva à última casa avistada e a esquerda é um acesso para Urubici, distante 39km dali. Fica então mais uma dica de caminho alternativo, que pode servir tanto como um acesso mais rápido ao Campo dos Padres (já que boa parte dela deve ser trafegável) quanto como uma quarta rota de fuga dessa travessia.

Na bifurcação em que tomei a esquerda, a estradinha mais à frente vira uma trilha na mata e desce. No primeiro campo que surge à esquerda desço pelo capim baixo atraído pelo som da água. Na beira desse campo, às 16h17, a surpresa é o Rio Canoas correndo num vale profundo e, mais que isso, uma espetacular cachoeira despencando do paredão à esquerda, resultado do grande desnível do leito do rio. Longa pausa para contemplação pois o lugar é mágico.

Durante o retorno à trilha principal da travessia, após cruzar de volta o Rio Canoas, subi pouco mais de 200m pela estradinha e entrei no campo à direita. Procurei até que encontrei uma trilha que corria paralela ao rio, bem acima dele, e que me proporcionou ótima vista de uma outra cachoeira, bem menor que a anterior, mas bem bonita também, com queda tripla.

Voltei à trilha principal da travessia e fui para a direita. Menos de 400m à frente me deparo com uma cerca de arame farpado sem passagem fácil. Já eram 18h e precisava arranjar algum lugar para passar a noite. Voltei um pouco nessa procura e deixei para cruzar a cerca no dia seguinte. Altitude de 1485m.

Água nesse dia não foi problema, cruzei pelo menos oito riachinhos bons para abastecer os cantis, todos pequenos afluentes do Rio Canoas, sem contar o próprio Rio Canoas, onde peguei água também.

Nesse dia caminhei 9,7km, contando os desvios para conhecer as cachoeiras.

6º DIA: DA GRANDE CACHOEIRA DO RIO CANOAS AO MORRO DA CRUZ (OU MORRO DA ANTENA)

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC6DiaAbr13.

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Cânion do Espraiado

Nesse dia me afastei do Rio Canoas e me aproximei da borda da Serra Geral novamente. O Rio Canoas a partir daquela grande cachoeira corre encaixotado num profundo vale e só fui reencontrá-lo no finalzinho da travessia.

Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 8h11. Cruzei por baixo a cerca encontrada ontem e 140m depois dela uma outra cerca (junto a um riacho), que atravessei também por baixo, caindo numa estradinha abandonada. O caminho à esquerda leva a uma casa a uns 200m, porém eu fui para a direita. Pouco mais de 150m depois entrei numa trilha à direita que penetra na mata pois o caminho pela estradinha logo começaria a ficar mais fechado, com árvores caídas. A surpresa ali foram alguns quatis passeando pelas árvores e que gostaram de fazer pose para a minha câmera. Logo a trilha me devolveu à estradinha, num ponto já melhor para caminhar.

Às 9h16 a estradinha se alarga e encontro três caminhos possíveis. Podia ter pego o da direita mas o mato invadindo a trilha começou a incomodar. Voltei e avancei pelo caminho da frente da trifurcação, que estava bem mais aberto (o terceiro ramo dessa trifurcação, o da esquerda, volta para o vale do Canoas). Atravessei um ótimo gramado para acampamento e caí numa trilha larga que devia ser continuação daquele ramo da direita que eu rejeitei. Fui para a esquerda e 40m depois à esquerda de novo em outra estradinha abandonada. Esquerda novamente na próxima bifurcação, subo um pouco e desço até uma outra estrada abandonada às 10h06, onde opto pela direita e imediatamente cruzo um riacho pelas pedras, afluente do Arroio Comprido, por sua vez afluente do Rio Canoas, segundo a carta topográfica.

Às 10h43 saltei pelas pedras o próprio Arroio Comprido, espantando algumas vacas, e em seguida passo por um colchete. Nesse local resolvi explorar algumas trilhas que poderiam servir de atalho para a travessia mas não tive muito êxito. Gastei 3 horas nessa investigação e voltei à estradinha, cruzando em seguida um outro afluente do Arroio Comprido às 14h. Depois de outro riacho (a última água do dia) peguei a esquerda na bifurcação seguinte e encontrei uma búfala com filhote bem no caminho. Já sabia da criação desses animais na região mas não conhecia o comportamento deles, se são como bois e vacas ou mais agressivos. Bom, essa pelo menos saiu correndo ao me ver e desapareceu.

Às 15h topei com uma estradinha mais larga e segui para a esquerda, subindo sob a sombra de uma pequena floresta de araucárias. Quando a paisagem se abriu à esquerda, pude ver o grande e profundo vale que abriga o Rio Canoas depois daquela cachoeira visitada ontem. Um verdadeiro cânion verdejante. E também avistei pela primeira vez o Morro da Igreja, bem distante no horizonte, mas com a enorme e inconfundível antena do Cindacta.

Às 15h35 alcanço a estrada de terra que leva ao Morro da Cruz, ou Morro da Antena, e nessa há marcas de passagem de veículo. Como esse morro era parte do meu roteiro, subi à esquerda. Se descesse à direita estaria tomando a estrada que desce diretamente ao Rio Canoas e é o caminho mais usado por quem visita o Cânion do Espraiado. Aqui temos então a quinta rota de fuga dessa travessia, numa distância de 9km até o Albergue Rio Canoas.

Como disse, subi à esquerda, e logo vi mais búfalos pastando bem próximo. No alto a estrada faz uma curva para a direita e uma estradinha secundária sai à esquerda, descendo, mas segui em frente (direita). Mais búfalos, uma porteira e mais acima larguei a mochila e caminhei campo adentro (à direita) para me aproximar da borda da crista onde eu me encontrava para a primeira visão do espetacular Cânion do Espraiado. À direita dele, a continuação da borda da Serra Geral, parte dela ainda a ser trilhada nessa travessia. E mais além a paisagem de morros e picos da Serra do Corvo Branco e do Parque Estadual da Serra Furada, conjunto que eu já havia avistado muito longe a partir do Morro da Boa Vista, no 4º dia.

Depois de várias fotos e explorar algumas trilhas que poderiam descer dali diretamente ao cânion (exploração sem sucesso), continuei pela estradinha e cheguei à antena às 17h22. Porém fui surpreendido por uma enorme antena... no chão! Depois me disseram que o dono das terras mandou derrubá-la com um caminhão. Explorei por ali também uma possível descida direta ao cânion mas toda a encosta sul é recoberta de mata alta e sem trilha. Pelo menos eu não encontrei nenhuma.

Já era hora de pensar num lugar para acampar, porém ventava muito e fazia bastante frio. A melhor opção foi montar a barraca dentro da estrutura de metal que servia de apoio à manutenção da antena, hoje vazia, sem nenhum equipamento, mas com algum lixo. A diferença de temperatura dentro e fora desse alojamento era brutal, então não tive dúvida de pernoitar ali dentro mesmo. O vento forte fazia qualquer peça solta das portas e paredes ficar batendo e fazendo barulho, então tive de prender todas para poder dormir. Altitude de 1606m.

A visão do Cânion do Espraiado e dos paredões da Serra Geral a partir da antena é muito bonita também, porém mais distante do que a partir daquele mirante que explorei mais abaixo no caminho.

Nesse dia caminhei 10,7km (na realidade caminhei bem mais pois explorei sem sucesso alguns atalhos).

7º DIA: DO MORRO DA CRUZ (OU MORRO DA ANTENA) À ARAUCÁRIA SOLITÁRIA

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC7DiaAbr13.

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Cânion do Espraiado e Serra do Corvo Branco ao fundo

Logo cedo, subi o morrinho ao lado da antena para checar a altitude máxima do Morro da Cruz e é de 1629m. A visão para todos os lados é sensacional, tanto dos paredões ao norte, quanto os do sul e a imensidão das terras abaixo, na direção do mar. Destaque para o Morro da Boa Vista e o Morro do Chapéu bem distantes ao norte. Havia sinal da Vivo e consegui fazer uma ligação para casa para dizer que estava bem.

Comecei a caminhar às 9h13 e às 10h passei pela bifurcação que me trouxe da parte norte do Campo dos Padres, continuando pela estrada principal (esquerda), que, como disse, desce diretamente ao Rio Canoas e é o caminho mais usado por quem visita o Cânion do Espraiado. Mais 15 minutos e me deparei com uma casa grande de madeira com quatro janelas largas e até pensei que fosse ali o local da cobrança para visita ao cânion, mas estava deserta. Em frente à casa, abandonei essa estrada e peguei uma secundária que sobe à esquerda. Na sequência ela desce e já proporciona vista do cânion bem perto.

Cruzei dois riachos e uma porteira e me aproximei de uma outra casa às 10h48, esta deserta também porém com cachorros para alardear a minha presença. Nessa casa é que é cobrada a entrada para visitar o cânion, porém nem sei quanto se paga pois não havia ninguém para cobrar. Cruzei um colchete à direita da casa e fui na direção da mata, encontrando uma trilha por onde desci. Quando saí da mata, me deparei com uma estradinha vindo da esquerda, que deve ser um acesso mais usado do que a trilha que peguei. Às 11h10 alcancei o vértice do Cânion do Espraiado, na cota dos 1376m, e a paisagem é de cair o queixo. Do vértice, avista-se entre os paredões do cânion a estradinha sinuosa da Serra do Corvo Branco.

Não explorei o lado leste do cânion, parti direto para o lado oeste pois seria o meu caminho para chegar ao Albergue Rio Canoas no final do dia seguinte. Cruzei então uma cerca e caminhei junto à beirada do paredão, atravessando três riachos que poucos metros à esquerda despencam no precipício.

Caminhei sem pressa até a extremidade da face oeste e às 12h27 fiquei de frente para a impressionante torre de pedra, com magnífica paisagem de fundo. Dali em diante meu caminho seria junto à borda da serra (sudoeste/sul) até o ponto certo onde descer ao albergue. O primeiro passo foi encontrar uma trilha para vencer a mata na encosta do morro a oeste, mas não foi difícil e a faixa de árvores devia ter uns 50m apenas, porém subindo bastante.

Alcançado o campo num nível acima do cânion às 13h30, passei a caminhar tendo a borda do penhasco bem próxima à minha esquerda e desviando dos minicânions que surgem. Às 14h02 passei pelo último ponto de água desse dia e do restante da travessia, por isso é bom abastecer todos os cantis. Aliás esse singelo riachinho também despenca na forma de uma alta e bonita cachoeira no penhasco poucos metros à esquerda. Subindo um pouco mais, destacam-se à frente grandes elevações bem à beira da serra, enormes morros cortados abruptamente na face leste formando paredões gigantes a pique. E é pela beira desses altos morros que a travessia seguirá amanhã. É bom ter essa referência visual para tomar o caminho certo ao chegar lá.

Às 14h40 atravessei por trilha um outro cinturão de mata, este mais extenso que o anterior, e volto a caminhar pelo campo por mais uns 300m, quando um outro segmento de mata me obstrui o caminho. Não encontrei trilha para atravessá-lo, então a melhor solução foi descer à direita diretamente em direção a uma araucária solitária, onde encontrei uma trilha larga e bem marcada.

Gastei um bom tempo explorando o lado direito dessa trilha, subindo um pouco (como se estivesse voltando), e depois o lado esquerdo, descendo (e depois subindo) na direção da continuação da travessia. Com isso o dia findou e resolvi acampar próximo à mencionada araucária. Altitude de 1314m.

Nesse dia caminhei 10,3km da travessia em si (e mais alguns km de explorações de outros caminhos).

8º DIA: DA ARAUCÁRIA SOLITÁRIA AO ALBERGUE RIO CANOAS, FINALMENTE

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDaSerraGeralCampoDosPadresECanionDoEspraiadoSC8DiaAbr13.

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Cânion do Espraiado

Desmontei acampamento e comecei a caminhar às 8h. Uns 70m abaixo da araucária há uma bifurcação onde desci à direita, entrando na mata. Ao se aproximar de uma cerca, a trilha fecha e parece não haver continuação do outro lado. Mesmo assim, atravessei a cerca e a matinha curta e alcancei um final de estradinha abandonada. Subi por ela e, mais acima, ao atingir um primeiro platô, ela se dirige para a direita, bordejando o morro à frente. Aqui é preciso cuidado para não errar o caminho. Seguir por essa estradinha contornando o morro pela direita não me levou a lugar nenhum, só a mato fechado. O melhor mesmo é abandonar a estradinha ao atingir esse primeiro platô e se aproximar da beirada da serra à esquerda para subir todo o morro à frente pelos campos meio sem trilha mesmo (ou com alguma trilha de vaca). Manter-se próximo à borda aqui evita tomar caminho errado e de quebra proporciona uma visão espetacular dos penhascos ao sul e ao norte.

Atingido o topo do morro mais alto, a 1473m, avistam-se novamente ao sul os morros e picos da Serra do Corvo Branco, do Parque Estadual da Serra Furada e o Morro da Igreja, agora um pouco mais próximos. A sudoeste, no vale do Rio Canoas, já se vê o Albergue/Pousada Rio Canoas e a Pedra da Águia, porém esta num ângulo muito diferente, como continuação de uma crista que inicia no próprio morro onde se está.

Ao começar a descer desse morro mais alto, o caminho natural é contornar a borda do penhasco e ir em direção a uma cerca num platô logo abaixo, onde se encontra uma trilha bem marcada. Cruzando a cerca por um colchete, em menos de 100m começa uma descida com muita lama e pedras de quase 300m de extensão. No meio dessa ladeira escorregadia se destaca à esquerda, entre as árvores, uma ponta mais alta dos paredões. Procurando bem, encontrei uma trilha que saiu da principal e subiu toda essa ponta até o topo, onde a visão do vale do Rio Espraiado com o imenso cânion à esquerda foi de cair o queixo!

Voltei à trilha principal e desci até encontrar uma cerca, que tive de cruzar por baixo. Estava bem na beira dos paredões novamente e pela última vez nessa travessia, então parei um instante para contemplar a extensa vista para leste, na direção do litoral, como sempre espetacular. Altitude de 1282m. Esse local, bem próximo à cerca, tem como referência uma árvore um pouco isolada das demais coberta de um líquen comprido parecendo uma barba. Depois dela a borda da serra volta a subir na direção sul. Mas o meu caminho foi quebrar 90º à direita na árvore e descer pelo vale que me levaria de volta ao Rio Canoas.

Passei por um colchete e quase 700m depois da árvore a trilha bem marcada começa a se transformar numa estradinha interna do sítio, cuja casa de madeira meio abandonada e vazia não demora a aparecer. Logo abaixo dela uma porteira, mais à frente dois riachos que atravessei pelas pedras (a primeira água fácil desde ontem às 14h02) e quase no final outra porteira, seguida do último riacho. Mais alguns metros e desemboco numa rua: 100m à direita está o Rio Canoas, já adulto, muito maior do que quando o deixei no 5º dia da caminhada. Mas o meu destino final também estava perto, 200m à esquerda, subindo a rua: o Albergue Rio Canoas, onde fui muito bem recebido pelo Mauro (que cuida do lugar) e um casal ali hospedado, que se desdobraram para me arranjar algo para matar a fome já que a minha comida havia acabado e não há nenhum lugar para comer por ali.
Altitude de 1033m.

Nesse dia caminhei 6,3km em cerca de 4 horas.

Total da travessia: 79,1km.

Ainda deu tempo de conhecer um famoso atrativo local nesse dia, a Pedra da Águia. Para isso caminhei até a estradinha que margeia o Rio Canoas (a 250m do albergue) e fui para a direita, cruzando um afluente do Canoas pelas pedras e uma porteira. Caminhei apenas 600m pela estrada e já tinha o melhor ângulo para fotografar a famosa pedra.

No dia seguinte, o Mauro conseguiu para mim uma oportuna carona já que sair desse local de ônibus iria me obrigar a caminhar 7km de estrada até o ponto final do circular para Urubici, que sai apenas duas vezes por dia.

Informações adicionais:

Horários de ônibus:
. Florianópolis-Lomba Alta: www.reunidas.com.br (R$ 28,37)
. vale do Rio Canoas-Urubici: 6h e 12h30 (somente seg a sex)
. Urubici-vale do Rio Canoas: 11h30 e 18h (somente seg a sex)

Hospedagem em:
. Pedra Branca: Hospedaria das Montanhas - 48-8412-4383 (Oi)
. vale do Rio Canoas: Albergue/Pousada Rio Canoas - www.riocanoas.com.br - reservas@riocanoas.com.br - no albergue a diária é R$30 no quarto coletivo sem café, mas com cozinha disponível

Cartas topográficas de:
. Alfredo Wagner-SC (http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-IV-1.jpg)
. Bom Retiro-SC (http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-IV-3.jpg)
. Aiurê-SC (http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SH-22-X-B-I-1.jpg)

Repetindo as possíveis rotas de fuga dessa travessia:
. do Morro do Chapéu a Bom Retiro (30km)
. do Morro da Boa Vista a Urubici (36,6km)
. do Campo dos Padres a Anitápolis pela Trilha dos Índios (5,6km de trilha + 22km de estrada)
. da grande cachoeira do Rio Canoas a Urubici (39km)
. da bifurcação do Morro da Cruz ao Albergue Rio Canoas (9km)

Rafael Santiago
abril/2013

terça-feira, 21 de maio de 2013

Circuito de trilhas no sul de Floripa (SC) - mai/13

ImagemPraia da Solidão

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/CircuitoDeTrilhasNoSulDeFlorianopolisSCMai13.

O tracklog está em www.mochileiros.com/circuito-de-trilhas-no-sul-de-floripa-sc-mai-13-t82660.html.

1º DIA: DE PÂNTANO DO SUL A NAUFRAGADOS, CAIEIRA DA BARRA DO SUL E PERNOITE NO PASTO DE VOLTA AO SAQUINHO

No Terminal Central - TICEN (ao lado do mercado municipal, no centro de Floripa) peguei às 7h57 o ônibus "Rio Tavares-direto" (nº 410), que chegou ao Terminal de Integração Rio Tavares (TIRIO) às 8h13. Ali mesmo, sem pagar outra passagem, peguei o ônibus "Pântano do Sul", que saiu às 8h30 e chegou às 9h ao ponto final, na Costa de Dentro. A enseada do Pântano do Sul é dividida em três partes: a vila de Pântano do Sul propriamente dita, na extremidade leste, o Balneário dos Açores, com casas e prédios novos e de padrão mais elevado, e a Costa de Dentro, um bairro que parece ser um pouco mais antigo também, na ponta sudoeste da enseada. O ponto final do ônibus, como disse, foi na Costa de Dentro.

Ajeitei a mochila e comecei a caminhar às 9h09 na direção do final da rua (cerca de 50m), onde há uma bifurcação e um totem com diversas placas coloridas indicando praias e pousadas. Segui a placa da Praia da Solidão e fui para a esquerda, entrando na Rua Lauro Mendes. Menos de 150m depois um outro totem de placas coloridas me manda entrar na rua à direita, a Rua Inério Joaquim da Silva, que deixa o bairro e vira uma estrada de asfalto que sobe bastante e desce já na Praia da Solidão. Dei uma olhada na praia, completamente deserta apesar do sábado de sol, e aproveitei para calibrar o altímetro do gps. Voltando à rua principal do bairro, vi no final de uma rua à direita uma placa de "cachoeira" e entrei. Essa placa mandava entrar à direita de novo e outra em seguida apontava um caminho à esquerda, que cruzou um riacho pelas pedras e virou uma trilha na mata. Segui por ela por uns 400m e só encontrei o Rio das Pacas descendo entre grandes pedras, onde a trilha aparentemente terminava. Dali para cima havia apenas um conjunto de mangueiras de captação de água. Pensei comigo: mais um rio com pequenas quedas que chamam aqui de cachoeira. Mas parece que eu estava enganado. Depois me disseram que eu teria que subir mais para encontrar uma cachoeirinha de verdade, com poço e tudo. Ficou para a próxima.

Voltei à rua principal, que logo começa a subir e cujo calçamento vira duas faixas paralelas de concreto. Passo pelas últimas casas às 10h13 e o caminho se reduz a uma faixa de concreto apenas, que é a "trilha" para a Praia do Saquinho. Essa trilha concretada causa um certo estranhamento, mas acredito que seja melhor assim pois evita a erosão da encosta e melhora a circulação dos moradores já que o trajeto é bem íngreme em alguns pontos, chegando a 90m de desnível.
Zoom in (real dimensions: 720 x 540)Imagem
Praia do Saquinho

No final da descida entrei numa rua à esquerda e fui ver a Praia do Saquinho, que é minúscula e cheia de pedras. Alguns moradores pescavam no costão na outra ponta. Voltei à trilha concretada, que terminou na vila às 10h52. São bem poucas casas, algumas de madeira, uma autêntica vila de pescadores ainda.

Ali tentei obter informações sobre a condição das trilhas para Naufragados e Caieira da Barra do Sul, mas o morador só confirmou o que eu havia lido, que as trilhas caíram em desuso e estavam tomadas pelo mato. Pura besteira. Só um trechinho da trilha para Caieira é que está fechado, como pude comprovar depois. São as bobagens da crendice popular, como já me havia acontecido na travessia Camburi-Trindade (lá é ainda pior por causa do intere$$e dos guias locais). Depois dos costumeiros avisos de trilha complicada e muitas cobras pelo caminho, dei continuidade à minha caminhada.

Sabia que se quisesse ir direto para Naufragados deveria me manter próximo ao mar para fazer todo o contorno do sul da ilha, e se quisesse ir para Caieira deveria encontrar uma trilha à direita que cortasse a ilha no sentido oeste até o outro lado já que essa praia fica voltada para o continente. Como não encontrava a tal trilha para a direita, fui seguindo junto ao mar. Às 11h30 uma estrutura de madeira grossa à direita da trilha me chama a atenção. São os restos de um antigo engenho e próximo a ele um forno de barro em forma de iglu. Relíquias do passado colonial da ilha que estão abandonadas e sofrem com o vandalismo.
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Praia de pedras à direita do Pastinho

Continuando pela trilha batida e sem dificuldade alguma, passei por dois pontos de água (a única água fácil do dia, sem contar obviamente a que se pode comprar nos bares das praias), um pé de mexerica carregado, uma cerca com passadiço e às 12h47 chego à Ponta do Pasto, mais conhecido como Pastinho. O lugar é bem bonito e interessante, uma ponta de capim e rochas que se projeta entre o costão rochoso ao norte e uma praia de pedras ao sul. Bem em frente as Ilhas Três Irmãs. À esquerda, mais ao norte, se vê a ponta montanhosa que fica a leste do Pântano do Sul e à direita, bem distante, a Praia da Pinheira, no continente. O local ainda é usado como pastagem de gado, mas não deixa de ser um bom ponto de acampamento, embora sem água próxima.

A continuação da trilha aponta para a mata e daqui em diante ela se afasta um pouco do mar. Começa já com uma subida forte. Numa bifurcação com um plástico branco preso num tronco, às 13h24, resolvi ir para a direita e subir mais (e acabei não explorando o ramo da esquerda). A travessia até Naufragados atinge então o seu ponto mais alto, 172m de altitude. Descendo um pouco chego às 13h50 a uma bifurcação importante, mas sem nenhuma sinalização: à esquerda a Praia de Naufragados e à direita um dos três caminhos que se juntam para o acesso entre Naufragados e Caieira da Barra do Sul (os outros dois são pelo Restaurante Golfinho e pelo farol de Naufragados). Fui para a esquerda e notei a trilha bastante roçada, e coisa bem recente.

Logo encontrei um casal na trilha e eles me disseram que aquele trecho tinha sido roçado para uma prova que estava para acontecer. Talvez por isso eu não tenha pego a trilha com mato em nenhum momento.

Às 14h22 outra bifurcação. Tudo indicava que eu deveria descer à direita, mas fui explorar o ramo da esquerda primeiro, que termina no costão, onde há uma casa isolada. Valeu pela vista do farol, na outra extremidade da praia. Infelizmente o tempo havia mudado e o céu estava cinzento, com muito vento, ameaçando chover a qualquer momento. Voltei à bifurcação e às 14h39 cheguei à Praia de Naufragados, que continua bastante preservada, com algumas casas escondidas no meio da vegetação.
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Praia de Naufragados

Cruzei seus 700m de areia batida e subi as pedras do canto direito para alcançar uma trilha logo acima que leva ao farol, mas no caminho uma placa aponta para os canhões à direita e subi lá primeiro. São três canhões que apontam para a entrada da Baía Sul da Ilha de Santa Catarina, cada um fixado a uma plataforma circular de concreto, sendo o pouco que restou do antigo Forte Marechal Moura de Naufragados, construído entre 1909 e 1913. Com mais atenção nota-se no fundo de cada plataforma o respectivo corredor entrincheirado, usado para movimentar a munição, e que os três corredores convergem para o mesmo ponto, onde a munição era distribuída. Infelizmente esses corredores estão atualmente tomados pelo mato.

Depois visitei o farol, de 1861, bem mais baixo do que eu imaginava. Uma plataforma de madeira ao lado dele permite ver a Ilha de Araçatuba com as ruínas da Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Araçatuba, de 1742, e à direita a Praia do Sonho, no continente. A fortaleza foi durante muito tempo a única fortificação destinada a proteger a entrada da Baía Sul da ilha, até a construção do Forte Marechal Moura, 167 anos depois. Terminei o passeio com uma rápida visita ao antigo porto, um velho trapiche de pedra com a Praia do Sonho bem em frente.

Esses três atrativos da Praia de Naufragados estão bem sinalizados nas bifurcações, porém estranhamente o caminho para Caieira não, o que deixa alguns visitantes em dúvida. Saindo do farol, basta pegar a esquerda na primeira bifurcação (a direita vai para a praia de Naufragados) e a direita na segunda (a esquerda vai para o porto). Uns 200m depois, numa bifurcação sem placa, deve-se ir para a esquerda (a direita leva aos canhões). Eram 16h04 quando deixei Naufragados. A trilha atinge o ponto mais alto na cota dos 146m. Nas outras duas bifurcações do caminho, basta ir para a esquerda. Essa última bifurcação é a junção das três trilhas para Caieira que mencionei.

Na descida final para Caieira a trilha atravessa alguns pastos e sofre com muita erosão. Uma placa depredada bem no começo da trilha informa que a área faz parte do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, que abrange a ponta sul da Ilha de Santa Catarina e as Ilhas Três Irmãs, entre outras.
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Ilha de Araçatuba com as ruínas da Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Araçatuba, de 1742

A trilha termina/começa entre dois grandes terrenos usados como estacionamento e ali, às 17h, procurei informação sobre o caminho direto de volta à Praia do Saquinho. Estava a 35m de altitude.

Ao lado do estacionamento da direita, caminhei pelo pasto sem uma trilha muito bem definida e atravessei uma sequência de três colchetes. Passei por algumas casas e a trilha terminou numa rua de terra que subia da avenida da praia. Subi então à direita, atravessei uma porteira e passei pela última casa da rua, de cor salmão. A rua de terra continuou subindo forte e alcançou um pasto, onde um homem muito mal-humorado que tratava das vacas me disse que a trilha para o Saquinho era difícil, mas me deixou cruzar o seu terreno (deve ter pensado: deixa esse sujeito se lascar). Atravessei um colchete e encontrei a trilha bem marcada já que leva a outro pasto mais acima. A subida é forte de novo e olhando para trás vão se acendendo as luzes de Caieira e da Praia do Sonho, no continente. Atravessei mais dois colchetes e no terceiro, com um curral coberto de telhas à esquerda, alcancei às 18h o outro pasto, que tinha como referência já que fica bem na crista, dali seria só descer para o lado leste da ilha. Como quase já não havia luz natural, tratei de arranjar um lugarzinho plano para montar a barraca. As vacas estavam por ali mas não chegaram nem perto e a chuva que ameaçou cair a tarde toda felizmente não veio. Altitude de 258m.

Na parte mais baixa desse pasto há uma nascente mas é melhor purificar a água ou fervê-la para o consumo.

Nesse dia caminhei 17,1km.
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Caieira da Barra do Sul

2º DIA: DO PASTO À LAGOINHA DO LESTE E À PRAIA DA ARMAÇÃO, COM DIREITO A MUITA CHUVA E VENTO

Desmontei acampamento logo cedo e comecei a caminhar às 7h20. Do alto desse pasto onde acampei podia ver o mar dos dois lados da ilha. Desci pela calha natural do pasto no sentido leste e no final dele encontrei uma cerca que tive de cruzar por baixo, logo depois da nascente de água que mencionei. Após a cerca a trilha continua, mas depois de uns 300m começa a ficar mal definida. Numa primeira bifurcação tanto faz ir pela direita ou esquerda, são variantes, mas na segunda, poucos metros depois, deve-se descer à direita, passando por baixo de outra cerca. Se estiver sem água, é só caminhar uns 60m para a esquerda nessa bifurcação.

Menos de 50m depois dessa segunda cerca, a trilha desaparece, engolida pelo mato alto (de cerca de um metro de altura). Desci por 150m pelo caminho que parecia ser o menos ruim e acabei reencontrando a trilha. Após cruzar um riacho ela volta a ficar bem batida, até que alcanço a trilha Saquinho-Pastinho, percorrida ontem, exatamente no local do antigo engenho e do forno de barro, às 8h40. Procurei essa trilha ontem a manhã toda e me distraí justo no momento em que ela estava ao meu lado. Mas acho que foi melhor assim pois até então não tinha informações confiáveis sobre ela.

No retorno ao Pântano do Sul, passei pela vila do Saquinho às 9h, pela Praia da Solidão às 9h30 e cheguei ao ponto de ônibus da Costa de Dentro às 9h51. Descansei e mastiguei alguma coisa e às 10h10, ignorando o tempo fechado, dei início à segunda caminhada, a travessia dali até a Praia da Armação tendo como principal atrativo a Praia da Lagoinha do Leste.

Optei por caminhar pela avenida principal do bairro em vez da praia para conhecer melhor o lugar e ver como está diferente de quando eu andei por ali, muitos anos atrás, principalmente por causa do tal Balneário dos Açores. Mas ainda há dunas e vegetação preservada mais próximo da vila do Pântano do Sul.
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A Praia da Lagoinha do Leste é parque municipal desde 1992

A avenida terminou no final da rodovia SC-406 (por onde cheguei do centro de Floripa ontem). Dali bastou quebrar à esquerda por 120m e entrar na segunda rua à direita, bem em frente à portaria azul e branca do condomínio Caravellas IV Residence. A rua estreita vira uma ladeira íngreme mas em 100m uma placa amarela à esquerda aponta o início da trilha para a Praia da Lagoinha do Leste, informando que se trata de um parque municipal, ou seja, uma unidade de conservação. Uma outra placa meio apagada informa que a trilha tem 2361m de extensão (medi 2,2km com o gps).

Entrei na trilha às 10h54 me deparando com bastante erosão, grandes pedras e raízes expostas, denunciando que ela é bastante frequentada. E é isso mesmo, apesar do tempo feio cruzei com muita gente, grande parte carregando sua prancha de surf. Às 11h18 passei pela chamada Estação Curso d'água, uma fonte à esquerda da trilha, e às 11h34 alcancei a bifurcação da Estação Platô, onde dois deques de madeira a 187m de altitude servem como mirante para as praias de Pântano do Sul de um lado e Lagoinha do Leste do outro. Um deles é coberto e o outro não, talvez este tenha tido a cobertura depredada, assim como as tábuas do piso de ambos estão sumindo também. O tempo estava piorando e o vento vindo do mar já trazia garoa até ali.

Continuando, a trilha atravessa uma mata alta e atinge seu ponto mais alto na cota dos 207m para imediatamente começar a descer. Cruzei mais um bando de gente subindo de volta por causa do tempo e a chuva não tardou a chegar, me obrigando a acelerar um pouco para não pegar a trilha íngreme ainda mais escorregadia. Cheguei enfim à Praia da Lagoinha do Leste às 12h26 e me abriguei numa cabana-bar bem no final da trilha. O teto era de palha e pingava para todo lado, mas fiz um lanche ali assim mesmo.
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Praia de Pântano do Sul vista do mirante na trilha para Lagoinha do Leste

A chuva ia e vinha sem sinal de trégua e fui ficando ali, diante da praia deserta. A única movimentação acontecia na entrada na mata nos fundos da cabana onde eu me abrigava. Me veio à lembrança a história do morador solitário da Lagoinha, o Michael (Maicol), e logo alguém me disse que ele estava ali pois estava cuidando do bar que funciona na cabana. Fui convidado a me abrigar na grande lona estendida e aceitei. Conheci assim o Michael, muito gente boa, que contou um pouco da sua singular trajetória. Ele mora sozinho ali na Lagoinha há 20 anos! Mas gosta de receber visitas e dá atenção a todos. O seu acampamento não é aquele, mas mesmo assim fazia questão de que todos ficassem à vontade e se servissem do que ele tinha para comer e beber, presente do pessoal que visitou a praia e foi embora mais cedo por causa do mau tempo. Ele disse que de vez em quando vai a Pântano do Sul comprar mantimentos e ver gente, mas não se demora, e que o inverno é uma época difícil por causa da solidão e isolamento, já que ninguém aparece na praia por um bom tempo. É uma forma de viver e compreender a vida que, se não desperta a vontade de fazer o mesmo (algo bem difícil de acontecer), pelo menos leva a uma reflexão do que é essencial e de como são infinitas as possibilidades de tocar a própria vida. Para quem está acostumado à vida massificada das grandes cidades, isso soa apenas como mais uma loucura, mas é interessante se deter um pouco sobre o assunto e refletir.

A chuva não arredava pé mas já era hora de eu prosseguir a caminhada. Infelizmente meu retorno à Lagoinha do Leste depois de quase 20 anos não ocorreu no melhor dos dias. Me despedi do Michael e seus amigos e caminhei até a outra extremidade da praia para pegar a trilha para a Praia do Matadeiro. No caminho, entrei em duas trilhas nas dunas para observar de longe a lagoa mas o dia feio não empolgava para fotos. Alcancei o fim da praia e o início da trilha às 14h27.

Ao contrário da trilha que vem de Pântano do Sul, que sobe e desce um grande morro no sentido oeste-leste, a trilha para Matadeiro acompanha todo o contorno do costão ao norte, a princípio a céu aberto depois por dentro da mata.

A trilha sobe bastante no começo com algumas variantes e bifurcações. Descobri que o caminho mais usado seguia pela esquerda numa primeira bifurcação e à direita na segunda, atingindo o topo do morro, onde uma outra trilha bem batida desce um pouco e acompanha o costão mais ou menos em nível (sem subir nem descer quase). A visão do mar verde e profundo se chocando nas imensas pedras é muito bonita mesmo, pena estar chovendo...
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Praia da Lagoinha do Leste

Depois a trilha passa a correr por dentro da mata alta, com pouca visão do mar, e cruzo dois pontos de água em sequência por volta de 16h23. Acelerei o passo pois com o tempo fechado iria escurecer logo no meio da mata, e cheguei enfim à areia da Praia do Matadeiro às 16h54, após percorrer no finalzinho uma trilha concretada igual à da Praia do Saquinho. Caminhei os 700m da Praia do Matadeiro, que é bem curiosa pois não tem ruas e acesso a carros, e ao fundo, atrás das casas, há uma encosta de pasto onde cavalos pastavam. Só alguns destemidos surfistas curtiam o mar na extremidade norte, junto à Ponta da Campanha.

O único acesso ao Matadeiro é feito por uma trilha de concreto (mais uma!) que começa na ponte sobre o Rio Sangradouro, que a separa da Praia da Armação.

Peguei então a trilha de concreto, cruzei a ponte e fui para a esquerda e depois primeira à direita, alcançando no final da rua a igreja do bairro da Armação, em frente ao mar, onde já havia passado de ônibus na manhã anterior. Num instante, peguei o ônibus no ponto do lado direito da igreja (confirmando que ele seguia para o centro mesmo) e refiz o esquema de descer no terminal TIRIO, pegar o "410 - Rio Tavares-direto" e descer no terminal central, ao lado do mercado municipal, no centro de Floripa. E a chuva castigando.

Nesse dia caminhei 10,3km até a Praia da Lagoinha do Leste, depois disso parei de registrar.

Informações adicionais:

Horários de ônibus (tarifa de R$2,90):
. Rio Tavares - direto (nº 410): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=410%20%20%20&menu=2
. Pântano do Sul (nº 564): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=564%20%20%20&menu=2
. Costa de Dentro (nº 563): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=563%20%20%20&menu=2

Carta topográfica de Paulo Lopes: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-4.jpg

Rafael Santiago
maio/2013

Percurso na carta topográfica - parte 1

Percurso na imagem do Google Earth - parte 1

Percurso na carta topográfica - parte 2

Percurso na imagem do Google Earth - parte 2

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Travessia do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (SC) - abr-mai/13

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Face sul do Pico do Tabuleiro


As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDoPqEstDaSerraDoTabuleiroSCAbrMai13.

O tracklog está em www.mochileiros.com/travessia-do-pq-est-da-serra-do-tabuleiro-sc-abr-mai-13-t82426.html.

O Parque Estadual da Serra do Tabuleiro foi criado em 1975 e é a maior unidade de conservação do estado de Santa Catarina. Apesar disso, ocupa apenas 1% do território do estado. Sua área de 841,3 km2 ocupa parte do território dos municípios de Florianópolis, Palhoça, Santo Amaro da Imperatriz, Águas Mornas, São Bonifácio, São Martinho, Imaruí e Paulo Lopes, ou seja, a diversidade de biomas é grande, indo desde os campos de altitude do interior até as restingas e manguezais do litoral e das ilhas. Quem caminha pelas trilhas do sul da Ilha de Santa Catarina sabe pelas placas (enquanto não acabarem de depredar todas) que está andando também pelo PE da Serra do Tabuleiro, que é administrado pela FATMA (Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina).

Meu primeiro contato com esse parque foi através da revista Aventura & Ação, edição nº 132 (sem data, mas provavelmente de janeiro de 2006). Porém a linha editorial da revista não é de publicar roteiros detalhados e, sem as informações necessárias, a idéia ficou guardada por um bom tempo. Diga-se de passagem, na matéria o relato dessa travessia é extremamente superficial.

Quando resolvi voltar a pesquisar sobre a travessia do parque, encontrei pouco material na internet, algumas fotos, mas achei os arquivos para gps de que precisaria, com vários pontos marcados. Já tinha assim o suficiente para me aventurar por mais essa região desconhecida para mim. Porém não contava em encontrar tanta dificuldade na segunda metade da travessia, com muitos trechos de mata alta e fechada que se deve atravessar sem trilha, varando mato mesmo, se enroscando e se arranhando todo. Somado a isso, próximo ao pico, mesmo a vegetação arbustiva é alta e compacta e dificulta cada passo dado, sendo impossível encontrar algum rastro de trilha, se é que existe algum. O melhor mesmo é fazer essa travessia em grupo e com pelo menos um facão para, num trabalho em equipe, localizar a possível trilha de aproximação do pico e reabri-la.

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Pico do Tabuleiro visto da rodovia BR-282, no posto Ipiranga do trevo de São Bonifácio

DIA O - DE FLORIPA AO INÍCIO DA TRILHA

Peguei o ônibus das 12h10 da empresa TCL na plataforma 5 do terminal da Praça 15 de Floripa com destino à pequena cidade de São Bonifácio. Durante a semana só há dois horários por dia dessa linha, o outro sendo às 17h50, bastante inconveniente para quem pretende fazer a travessia (a sugestão nesse caso seria dormir na Pousada das Hortênsias, a mais próxima do início da caminhada, mas não sei dizer o preço da diária). O atencioso motorista, ao saber que eu iria descer na estrada, perguntou para que local eu estava indo, e para minha tranquilidade ele conhecia tanto a entrada da Fazenda Weber quanto a do sítio do Gilson e Inês Hawerroth, os dois possíveis acessos à Serra do Tabuleiro pelo sul, sendo este último o meu destino. Depois de circular por todos os bairros possíveis e imagináveis das cidades do caminho, e até rodar por uma estrada de terra em plena mata, consegui saltar do ônibus azul às 14h55. Por sorte havia um ponto coberto na estrada pois o céu cinzento que havia se formado na última hora resolveu se transformar em chuva, o que me segurou por mais de uma hora ali abrigado. Esse ponto de ônibus fica 4km antes do centro de São Bonifácio e tem como referência uma placa marrom que indica os atrativos da localidade para onde eu me dirigia: Rio Moll, Recanto das Pedras e Travessia da Serra do Tabuleiro. Sim, por incrível que pareça, essa árdua caminhada (por conta da falta de trilha definida e dos muitos vara-matos, como disse) está escancarada ali numa placa de turismo à margem da rodovia, como se fosse um atrativo turístico igual aos outros.

Enfim dei início à pernada às 16h04 atravessando a SC-431 e tomando a estrada de terra bem em frente. A altitude é de 436m e a paisagem é toda rural, com pastos, vacas para todo lado e uma concentração de umas dez casas que atravessei após cruzar a ponte de madeira sobre o Rio Capivari e tomar a esquerda na bifurcação. A estradinha acompanha o Capivari (à minha esquerda) durante algum tempo mas logo se distancia dele e das casas e vai encontrar o Rio Moll mais à frente, correndo à direita. Esse rio, afluente da margem esquerda do Capivari, será uma referência durante toda a primeira parte da travessia pois percorrerei seu vale florestado em direção à sua nascente até o momento certo de subir a Serra do Tabuleiro.

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Uma das 16 travessias do Rio Moll

Às 17h10 alcancei o fim da estrada exatamente na frente da casa do Gilson, onde bati palma (altitude de 600m). Fui recebido por sua esposa, Inês, que me deu informações rápidas sobre o local e sobre o começo da trilha. "Não acampe perto do rio, ele é muito perigoso", recomendou fortemente ela, acrescentando que eu iria cruzar o Moll 13 ou 14 vezes, para minha surpresa (na verdade, foram 16 vezes).

O começo da trilha é bem ali do lado esquerdo da casa, não tem erro. Pelo horário eu sabia que logo teria que encontrar um local para montar a barraca, mas assim mesmo quis adiantar algumas centenas de metros ainda nesse dia e não quis pedir para acampar no quintal deles. A trilha imediatamente entra na densa mata ciliar e começa a cruzar o rio a cada poucos minutos, pelas pedras. Não há grande dificuldade mas um bastão ou cajado ajuda bastante, então tratei logo de arranjar um pedaço de tronco como cajado. Às 18h06, quase sem luz natural no meio da mata, encontrei um espacinho plano e pouco úmido para pernoitar. Já havia cruzado o Moll 3 vezes.

O céu no cair da noite continuava encoberto, com possibilidade de mais chuva, e a água que caía das árvores deixava tudo completamente molhado. Altitude de 666m.

Nesse dia caminhei 5,5km.
Zoom in (real dimensions: 720 x 404)ImagemPrimeira visão do Pico do Tabuleiro, ainda bem distante, à direita (o de topo mais chapado)

1º DIA - DO RIO MOLL AO MIRANTE DE FLORIPA

A luz natural demorou um pouco para penetrar o vale e a mata, o que me tomou algum tempo para saber se a chuva do dia anterior iria atrapalhar o meu primeiro dia de travessia ou não. Felizmente um sol forte deu as caras e os ânimos se renovaram. Nessa expectativa, acabei saindo tarde, às 9h35.

O Rio Moll, como disse, é uma referência constante pois a rotina da manhã toda foi cruzá-lo a cada 5 ou 10 minutos de trilha, mas sempre pulando pedras, sem necessidade de tirar as botas (uma boa bota impermeável vem bem a calhar nessas horas). Depois de atravessá-lo 12 vezes (contando desde o dia anterior) saio desse primeiro longo trecho de mata às 10h45 e encontro um pasto com vacas. A sequência agora passaria a ser essa: mais uma florestinha, outro pasto, cruza o rio, e assim por diante.

No quarto pasto, depois de atravessar o Moll 16 vezes, é hora de ficar atento. A tendência natural da trilha (de bois) é atravessá-lo mais uma vez, e foi o que eu fiz. Porém encontrei logo à frente a trilha toda tomada por um rio largo e raso. Percebi que havia passado um pouquinho do ponto onde se inicia a subida da serra. Cruzei o Moll de volta e fui para a esquerda pelo pasto, na direção da floresta, tendo o rio bem à minha esquerda. A altitude é de 774m e nesse momento a direção geral da travessia, que vinha sendo basicamente norte, quebra para leste. Ali na borda da floresta, às 11h27, encontrei facilmente a trilha que a penetra e sobe bastante sob a sombra das árvores. Dois minutos depois de um colchete, abasteci os cantis no riachinho pois seria a minha última água fácil do dia.

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Subindo o Morro das Pedras

A trilha sai no aberto às 11h59 e já é possível contemplar os morros e vales ao redor, embora ainda na modesta altitude de 865m. Na sequência, mais subida com samambaias e mais dois segmentos de mata até que se atinge o alto da serra, onde... vacas pastam! Quebra um pouco o clima de montanha, fazer o quê, mas é isso mesmo, grande parte dos caminhos dessa travessia são trilhas de boi que tomamos e abandonamos de acordo com a direção e conveniência.

Logo descobri também que parte do terreno é formada por turfeiras, que são uma vegetação "esponjosa", rosada ou avermelhada, que acumula água e que é o terror de quem faz travessias na Serra Geral de SC e RS por significar solo encharcado e cansativo para caminhar. Mas aqui elas são bem menos frequentes, felizmente.

No alto da serra, o pano de fundo para o tranquilo pastar bovino é uma cadeia montanhosa que surge a nordeste, com uma bela sequência de discretos picos que me traz uma boa novidade: a primeira visão do Pico do Tabuleiro, com seu característico topo chapado, ainda bem distante (cerca de 9km em linha reta), mas como um objetivo ao alcance do olhar.

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No topo do Morro das Pedras

Continuando a subida seguindo sempre os caminhos bovinos mais marcados, atinjo às 14h30 um ponto bastante alto e aberto (1209m) onde há sinal da Vivo e Claro para poder dar um alô em casa depois de muitos dias sem contato. Aproveitei para um descanso e um lanche também. À minha frente (noroeste) já vejo o Rio Moll correndo dentro de um profundo vale. Desse ponto já avisto também bem próximo (nordeste) o Morro das Pedras, aonde chego às 16h25.

O Morro das Pedras é uma crista formada de capim baixo, lajes e grandes blocos de pedra, a 1269m de altitude, com visão de 360º de serras distantes, e de onde se divisa a cidade de Florianópolis pela primeira vez na travessia, a nordeste.

Ultrapassado o topo do Morro das Pedras a trilha desce suavemente contornando-o pela esquerda e em menos de 400m (após o topo) há uma bifurcação pouco perceptível no capim. O caminho natural da travessia vai para norte/nordeste (esquerda na bifurcação), mas a descida até o vale à direita (leste) é bastante interessante pois sobe a seguir a um cocuruto de pedras de onde se avista Floripa de camarote, além do enorme vale do Rio Vargem do Braço à direita. A vista desse mirante estava tão inspiradora que resolvi acampar por ali mesmo e ter a oportunidade de contemplar as luzes da capital catarinense durante a noite. Altitude de 1227m.

Nesse dia caminhei 8,4km.

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Floripa vista do topo do Morro das Pedras

2º DIA - DO MIRANTE DE FLORIPA AO MINICÂNION

O feriado de 1º de maio amanheceu completamente fechado no alto da serra, a neblina não deixava enxergar mais que 50 metros ao redor. Junto aquela garoa fina característica. Sem condição nenhuma de navegação visual e também sem pressa alguma de terminar a travessia (estava de férias), enrolei a manhã toda para ver se o tempo melhoraria com o sol mais forte. E deu certo. Aos poucos a neblina foi se dissipando.

Com isso, acabei levantando acampamento somente às 13h40. Voltei pelo mesmo caminho até a bifurcação da tarde anterior e fui para a direita, descendo em direção a um riacho, uma das nascentes do Rio dos Porcos, onde parei para um lanche às 14h13. Retomando a caminhada às 14h42, acabo cruzando o mesmo córrego mais abaixo duas vezes e prossigo por um divisor de águas, com vales caindo para ambos os lados - nascentes do Rio Alto à direita e do Rio dos Porcos à esquerda. Subo um pouco e, contornando o morro à esquerda, desço a um vale e cruzo dois riachos, tributários de um outro córrego cujo vale se abre à minha direita (nordeste) e para onde os caminhos de boi me ajudam a seguir. Porém eles não me ajudam a descobrir o melhor ponto para atravessar duas faixas de mata sem trilha definida que aparecem a seguir.

Daqui em diante, os trechos de mata tornam-se ruins de passar pois lá dentro há caminhos de boi para todos os lados, e ao mesmo tempo há taquarinhas que enroscam em todo o corpo, na mochila, nos aparelhos pendurados (câmera, gps). Mas o que eu passei até aqui foi só uma pequena amostra do que ainda estava por vir.

O dia hoje não rendeu muito e logo depois da segunda matinha já era hora de montar acampamento, com a luz natural se esvaindo, às 18h. Altitude de 1018m.

Uma curiosidade: as águas desse vale onde acampei, ao contrário de quase todas as outras dessa travessia, juntam-se para descer a serra tomando o rumo leste num rio sem nome na carta que desemboca bem abaixo no Rio Vargem do Braço, o grande vale que avistei à direita no mirante de Floripa. Quase todas os outros córregos com que tive contato formam rios que descem a serra na direção oeste. Essas nascentes são a preciosa fonte de água para a Grande Floripa e litoral sul do estado, daí a importância da preservação do lugar.

Nesse dia caminhei 4,8km.

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Águas que vão para o vale do Rio Vargem do Braço

3º DIA - DO MINICÂNION AO COCURUTO VIZINHO AO PICO DO TABULEIRO

De manhã, com mais luz, é que notei quão profundo era o vale ao lado do meu acampamento, quase um pequeno cânion. Como disse, esse córrego é um dos que despencam serra abaixo na direção leste e ajudam a engrossar o Rio Vargem do Braço.

Comecei a caminhar às 8h40 e desci acompanhando o tal rio profundo até atravessá-lo facilmente pelas pedras depois de 17 minutos. Nessa descida, com o dia bem limpo (ao contrário de ontem), vou estudando o terreno à minha frente: uma muralha de morros bem altos com extensas faixas de floresta para complicar. Do ponto de vista que eu tinha tracei um caminho que me pareceu ser o mais desimpedido para a subida. No vale atravessei às 9h30 um bonito riacho com uma quedinha, abandonando com isso as trilhas de boi, que seguiam sem cruzar o riacho. Comecei a subir a encosta do alto morro sem trilha alguma, o que começou a me deixar ressabiado pois isso podia significar não estar num bom caminho. Porém, para minha surpresa, o gps confirmou esse trajeto. Pois bem, tanto eu quanto o gps estávamos errados pois aquele não era mesmo o melhor caminho. Devia ter seguido os bois e subido por uma outra encosta mais à esquerda (oeste). Aliás, essa é a proposta do tracklog do Hendrik Fendel (http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=3376898).

Esse caminho que eu tracei visualmente, e o gps confirmou, sobe muito, vara uma mata curta porém cerrada (com um plástico azul sinalizando uma entrada menos ruim) e chega ao topo do morro para em seguida... descer boa parte do que subiu atravessando uma florestinha meio complicada. Como se pode ver, um caminho bem ruim.

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Vale de uma das nascentes do Ribeirão Vermelho

De qualquer modo, por um caminho ou por outro, vamos atingir um riacho que é um dos formadores do Ribeirão Vermelho (aonde cheguei às 11h25), caminhar pouco mais de 200m bem junto a ele e abandoná-lo para subir a encosta da direita por trilhas de vaca ainda. Mas não sem antes encher todos os cantis pois seria a última água do dia.

Essa nova subida amplia muito a visão do horizonte em todas as direções e às 12h35 já tenho à direita (leste) um profundo e belíssimo vale que se abre lá embaixo no Rio Vargem do Braço, com um povoado e a torre de uma igreja. Para trás, é possível visualizar grande parte do caminho percorrido, desde o Morro das Pedras, pelo menos.

E subindo um pouco mais enfim surge à minha frente na cota dos 1222m o imponente e desafiador Pico do Tabuleiro, num ângulo em que o cocuruto que o acompanha fica à direita. Fiquei feliz por vê-lo finalmente, porém o que eu temia se concretizou: entre mim e ele um enorme e profundo vale recoberto de florestas. Qual caminho seguir? Muitas surpresas e perrengues estavam prestes a começar.

Mas antes uma boa surpresa, uma nova vista de Floripa, ainda mais próxima e mais bonita. Porém duas centenas de metros depois a má notícia: os trilhos e caminhos de boi desaparecem completamente, o que de cara torna a caminhada menos óbvia. Passo então a descer às 13h50 a encosta de gramíneas sem trilha alguma e na lenta aproximação com o pico um caminho vai parecendo o menos ruim: à direita, uma continuação natural da crista, porém mais baixa, serve como um selado ligando a montanha que desço ao maciço do Pico do Tabuleiro, mais exatamente ao cocuruto vizinho ao pico. Porém esse selado também não deixa de ter suas faixas de mata e trechos mais íngremes, ou seja, não seria um caminho fácil.

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Selado cheio de mata fechada que tive que atravessar sem trilha

Atinjo o ponto mais baixo do grande selado sem grande dificuldade (1059m), mas aí começam os fragmentos de mata. Como a chegada nessas matinhas se dá sem trilha alguma, perco algum tempo procurando uma entrada nelas que seja menos difícil e aponte para um possível caminho lá dentro com menos enrosco na vegetação cerrada, mas é praticamente em vão, não há mesmo um caminho, apenas vara-mato. Os quatro segmentos de mata do selado têm entre 40 e 200 metros de extensão cada um, mas fora deles também era difícil avançar pois a vegetação compacta de cerca de um metro de altura dificultava bastante cada passo.

Uma camiseta de manga longa aqui é uma ótima dica para não chegar ao pico e ao final da travessia com os braços pegando fogo de tão lanhados.

Após o quarto e último trecho de mata, o mais curto deles, termino de subir ao topo do cocuruto vizinho ao pico pelo capim baixo, porém com uma novidade, espinhentos gravatás, que insistem em espetar e cortar as pernas. Com o dia findando, às 18h, parei ali mesmo no alto do cocuruto e montei a barraca sobre um rastro de trilha que apareceu do nada. Altitude de 1206m.

De novo tive uma visão privilegiada da Grande Floripa à noite, com a extensa massa de luzes amarelas espalhadas pela ilha e pelo continente.

Nesse dia caminhei 6,7km.

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Nascer do sol na direção de Floripa

4º DIA - DO COCURUTO VIZINHO AO PICO DO TABULEIRO A CALDAS DA IMPERATRIZ

Do local onde acampei eu tinha o grande platô do Pico do Tabuleiro bem à minha frente, porém com um profundo vale nos separando, e, pior, forrado de densa floresta. Mas explorações na noite anterior deram esperança de haver uma tênue trilha por essa mata. Outro fator importante a considerar é que eu deveria transpor essa mata necessariamente na direção da língua de vegetação rasteira que desce do cume para tornar viável a ascensão do outro lado.

Desmontei a casa e parti às 7h31, adentrando a tal mata em menos de 100 metros. Dentro dela, procurando aqui e ali, um caminho foi se definindo e desceu bem forte e íngreme até um leito seco de rio. A primeira parte, portanto, já havia cumprido. Um pouco à direita, caminhando pelo leito seco, encontrei água parada porém limpa, que consumi sem problema. Restava encontrar a continuação do caminho para subir enfim a encosta do pico. Aí já não foi tão fácil. Não encontrei trilha e adentrei a calha de um outro córrego seco que parecia ir na direção desejada.

Aqui, sem trilha, sem visão nenhuma e tendo de alcançar a ponta da única faixa de vegetação baixa que desce do cume, tive de lançar mão de um ponto previamente gravado no gps e traçar uma reta até ele para não ficar varando mato em várias tentativas sem sucesso. Assim, ao sair da calha do córrego seco procurei algum caminho orientado pela direção apontada pelo aparelhinho. Depois de vários enroscos e espinhos, encontrei algo que parecia ser uma tênue trilha que subiu, passou por outra água parada (mas limpa) e saiu da floresta às 8h53 exatamente na língua de mato que dá acesso ao cume - ufa!

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Vale do Rio Vargem do Braço

Mas ainda faltava vencer um desnível bastante íngreme de quase 100m sem uma trilha bem definida, o que me matou logo cedo. Após subir com cuidado algumas lajes de pedra inclinadas e altas quase no topo, alcancei finalmente o cume do Pico do Tabuleiro às 9h38, confirmando seus 1249m de altitude.

Explorei as bordas do grande platô para registrar a espetacular paisagem e caminhei (por trilha bem definida) até a ponta sudoeste para uma visão do caminho percorrido desde o Morro das Pedras, ainda no primeiro dia da travessia. A noroeste, é possível ver os carros passando na BR-282, rodovia pela qual vim de Floripa, e o posto Ipiranga do trevo de São Bonifácio. A nota negativa ficou por conta do lixo deixado pelos farofeiros que acampam numa grande clareira a oeste do cume, exatamente onde chega a trilha que sobe de Caldas da Imperatriz.

Deixei o cume às 10h53 por essa trilha e levei bem mais tempo do que imaginava para chegar a Caldas: 3h40. A trilha, ao contrário do que havia lido, é bem aberta e marcada, sem nenhuma dúvida. O que acontece é que em alguns trechos os bambuzinhos projetam as folhas no caminho, raspando nos braços. De novo uma manga longa vai bem.

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BR-282 vista do Pico do Tabuleiro

A descida é toda feita na sombra da mata e é bem íngreme no começo, perdendo altitude rapidamente. Há duas pequenas clareiras que servem como mirante (uma na cota de 986m e a outra na de 857m), mas em outros momentos também é possível ver entre o arvoredo a grande muralha do Pico do Tabuleiro ficando para trás. Às 14h, aos 439m, cruzei um pequeno curso-d'água que pode molhar a goela seca mas não parei pois topei com uma cobra marrom clara de tamanho médio bem ao lado (e eu ainda tinha água de reserva). Mais 13 minutos e aparece um casebre de madeira deserto no meio do nada com placa de "Sítio Orgânico Montanha do Tabuleiro". Após uma plantação de eucaliptos desemboco numa outra trilha e vou para a direita. Essa vai se transformando numa estradinha precária até terminar às 14h32 numa rua concretada de um bairro, exatamente onde um pé de mexerica carregado me convida a adoçar a boca.

Dali bastou tomar à esquerda a rua concretada (que se assemelha a uma rua particular) e descer até a rua principal, onde há um portal de concreto com o número 2479 e um ponto de ônibus de cada lado. Altitude de 163m. Em poucos minutos tomei do outro lado da rua o circular Floripa-Caldas da Imperatriz que saiu do ponto final ali próximo às 15h15. Esse ônibus tem ponto inicial na plataforma 1 do mesmo terminal da Praça 15 onde tomei o ônibus São Bonifácio alguns dias antes.

Nesse dia caminhei 7,8km.
Total da caminhada: 33,2km

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Pico do Tabuleiro visto da descida para Caldas da Imperatriz

Informações adicionais:

O site oficial do parque é www.fatma.sc.gov.br/conteudo/parque-estadual-da-serra-do-tabuleiro.

Horários de ônibus:
O nome oficial do terminal da Praça 15 é Terminal Urbano Cidade de Florianópolis.

. Floripa-São Bonifácio (empresa TCL - www.transportescapivari.com.br) - plataforma 5 do terminal da Praça 15  - R$16,25:
seg a sáb - 12h10 e 17h50
dom e feriados - 17h50

. Floripa-Caldas da Imperatriz (empresa Imperatriz) - plataforma 1 do terminal da Praça 15 - R$5,40:
consultar o site www.avimperatriz.com.br

Cartas topográficas:
. São Bonifácio - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-3.jpg.
. Santo Amaro da Imperatriz - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-1.jpg

Rafael Santiago
maio/2013

Percurso na imagem do Google Earth - parte 1
Percurso na carta topográfica - parte 1
Percurso na imagem do Google Earth - parte 2
Percurso na carta topográfica - parte 2