segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Trilha do Pereira (Paraty-RJ) - dez/12

Casa do Sr Pereira
As fotos estão em http://lrafael.multiply.com/photos/album/142/Trilha-do-Pereira-Paraty-RJ-dez12.

A Trilha do Pereira é parte de um caminho tropeiro que liga Paraty a Cunha, ou seja, é uma conexão entre o litoral fluminense e o planalto paulista. O trecho desse antigo caminho que galga as encostas da Serra do Mar ganhou esse nome por ter como referência a fazenda do Sr Pereira, na borda da serra.

A travessia completa inicia no sertão do bairro São Roque, a 25km de Paraty, e vai até o bairro da Barra, que pertence a Cunha. Eu fiz apenas o trecho que leva à fazenda do Sr Pereira pois não tinha dados suficientes e logística montada para continuar até o bairro da Barra, onde eu poderia pegar um ônibus para Cunha, segundo me disseram (informação ainda não verificada).

O que vou descrever a seguir então é tão-somente a Trilha do Pereira, do bairro São Roque à fazenda do Sr Pereira, atualmente sem morador já que ele e os filhos se mudaram. Resolvi fazer o percurso de ida e volta em um dia com mochila de ataque pois tinha informação de 4 horas de subida apenas, o que não justificaria subir os 1100m de desnível com cargueira para acampar na fazenda e voltar no dia seguinte. Porém esses números estavam subestimados (para não dizer errados) pois a altitude chegou a 1395m e gastei 5h40 para alcançar a fazenda, caminhando sem parar.

Conjunto de quedas
Peguei o ônibus "São Roque" às 7h50 em Paraty e desci no ponto final às 8h20. Esse ônibus percorreu 21km pela Rio-Santos no sentido de Angra dos Reis, entrou no km 551,5 à esquerda e rodou mais 2,3km até o final do asfalto do bairro São Roque. Ele deu meia volta e eu continuei pela estradinha, que passou a ser de terra, em meio às últimas casas do bairro. Resolvi perguntar numa dessas casas pelo início da trilha e foi a melhor coisa que fiz pois é um começo muito discreto e quase imperceptível. Se não tiver a quem perguntar, é o seguinte: cerca de 270m a partir do ponto final do ônibus deve-se procurar uma trilha meio fechada que sai à esquerda dessa estradinha de terra e entra na mata, já que não há mais casas do lado esquerdo nesse ponto. Um início muito sutil para a trilha bem usada e muito bem marcada que iria encontrar depois. Apenas alguns metros e me deparei com o Rio São Roque, que corre paralelo à estrada, largo e sem ponte. A correnteza não estava forte e o rio estava raso, para minha sorte. Tirei as botas, improvisei um cajado e atravessei-o sem problemas. Em outras condições, com mais chuva, essa passagem pode se tornar difícil ou perigosa. Torcia para não chover ao longo do dia já que iria voltar pelo mesmo caminho.

Já na outra margem, calcei de novo as botas e coloquei as perneiras também pois não sabia quão fechada poderia estar a trilha. Dei início então à caminhada cruzando um colchete de arame farpado aos 121m de altitude. Eram 8h57. Mais tarde, quando vi a dificuldade da subida e o grande desnível a ser vencido, é que percebi como comecei tarde!

Logo de cara encontrei uma placa azul indicando "trilha para Cunha-SP", para minha surpresa, confirmando estar no caminho certo. Depois cruzei uma porteira de madeira com placa de "Sítio Sertão do Zezinho", mas não vi casa nenhuma, nada além de mata fechada daí para a frente.

Às 9h18, topei com a única bifurcação em todo o longo trecho de mata. Nela há uma outra placa "trilha para Cunha-SP", apontando para a esquerda. Mas antes de seguir por lá, explorei o ramo da direita, com uma placa "centro da mata - Parque Nacional da Serra da Bocaina" e o caminho de 170m deu no Rio São Roque. Voltei à bifurcação e peguei o lado certo. A subida a partir daí foi forte e constante.

Rio São Roque
Às 10h55 encontrei o primeiro ponto de água e às 11h13 passei ao lado de uma grande pedra à esquerda da trilha (706m de altitude na pedra). Três minutos depois dela um riachinho cruza a trilha depois de saltar por belas quedas à esquerda, dentro da exuberante mata. Às 11h47 a trilha se abre numa grande clareira com bastante lixo, sugerindo que ali pode ser local de descanso ou até pouso de quem faz essa trilha com animais. E falando em animal, um pouco antes desse lugar um bicho grande perto da trilha se assustou com a minha passagem e correu no meio da mata. Não consegui vê-lo mas devia ser grande pelo barulho do mato que arrastou ao fugir.

Continuando a subida, a trilha muda um pouco e começam a aparecer muitas pedras, dificultando um pouco o caminhar. Em alguns trechos, a trilha corre dentro de profundas valas escavadas ao longo de anos de uso. Mais alguns pontos de água e às 14h saio finalmente da mata e tenho visão dos morros à frente, mas ainda não vejo a casa do Sr Pereira. Havia acabado de passar pelo ponto mais alto da trilha - 1395m. Nesse momento eu já estava com 5h de caminhada e nada da casa. Não queria terminar o caminho de volta no escuro, mas também não conseguia parar enquanto não chegasse ao meu destino. Apressei o passo.

Ao sair do longo caminho na mata, a paisagem se abre
A picada passa agora a descer entre arbustos e alcança uma outra trilha, perpendicular, bem marcada, na qual sigo à esquerda, caminhando agora por um pasto sem gado. Contorno morros até que a picada entra numa mata, mas poucos metros depois sai dela para bifurcar num outro pasto marcado por um cocho feito de um grande tronco de árvore. Não é difícil saber qual lado da bifurcação seguir pois já é possível avistar a casa no alto, à esquerda. Foi só seguir na sua direção, cruzar uma porteira e subir um pouco. Cheguei enfim à casa de pau-a-pique do Sr Pereira às 14h37, com o meu cronograma estourado, e não encontrei vivalma, como já havia sido alertado. Altitude de 1362m.

Só tive tempo de descansar um pouco, mastigar umas bolachas, explorar os arredores da casa, tirar umas fotos e às 15h03 já estava dando início à volta, prevendo que caminharia no escuro. Paciência...

Desci o mais rápido que pude, mas a parte das pedras na trilha não me deixou ir mais depressa. Depois delas pude correr mais. Assim, consegui chegar ao Rio São Roque e atravessá-lo às 19h18, ainda com luz natural - bendito horário de verão!

Só então pude relaxar, fazer um lanchinho e curtir alguns minutos na margem do rio. Saí dali com o cair da noite às 19h53 e, como perdi o último ônibus "São Roque", caminhei os 2,3km até o ponto na rodovia Rio-Santos, aonde cheguei às 20h27 para esperar o próximo circular de volta a Paraty.

Informações adicionais:

Horários do ônibus Paraty-São Roque:
seg a sáb - 6h, 7h50, 9h10, 11h, 16h40
dom - 7h50, 11h20, 16h30
O ônibus leva 30 minutos para chegar ao ponto final e retorna imediatamente.

Cartas topográficas:
. Parati - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-C-I-2.jpg
. Cunha - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-C-I-1.jpg

Rafael Santiago
dezembro/2012

Trilha do Pereira na imagem do Google Earth

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Travessia Camburi-Trindade (Ubatuba-SP/Paraty-RJ) - dez/12

ImagemCachoeira da Escada - Ubatuba

Informações recentes: Refiz essa trilha em 25/12/2013 e verifiquei que ela está perfeita, com duas ou três árvores caídas apenas, facilmente contornáveis. O único problema é que faltando 400m para chegar à Praia do Caxadaço o campo de samambaias cresceu a tal ponto que soterrou a trilha, fazendo-a desaparecer. Se alguém reabrir o caminho ali com um facão na direção certa, em 60m reencontra a marca da trilha no chão. Eu optei por descer ao riacho à esquerda, andei um pouco por suas pedras e encontrei uma trilha na margem que me levou a uma trilha principal que se dirige a uma casa à esquerda e à praia à direita. Não fosse esse problema, teria completado a travessia em 4 horas, da Cachoeira da Escada à Praia do Caxadaço.
Dessa vez encontrei seca a única fonte de água que há no meio do caminho, portanto água fácil só no riacho que citei acima, já no finalzinho.


As fotos estão em http://lrafael.multiply.com/photos/albu ... SPRJ-dez12.
O tracklog está em http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=3860399.

A famosa travessia Camburi-Trindade para mim perdeu a aura de difícil, fechada e perrengosa. Na verdade mostrou-se uma trilha muito fácil e tranquila, desde que se tome o lado certo nas bifurcações. Ao contrário do que eu esperava, saí dela quase sem nenhum arranhão, já que não há vegetação obstruindo o caminho.

Consegui encontrar o início dessa travessia graças ao relato do Rodrigo (no Mochileiros) e daí em diante não sabia o que ia enfrentar e se ia conseguir completá-la, dados os relatos de vara-mato e trilha confusa, desde o mais antigo deles (2003) até o mais recente (2011). Mas o que encontrei foi um passeio na mata, literalmente. Passeio que dá para fazer em 5 horas a partir do início da trilha (ou 5h30 a partir da Cachoeira da Escada). Só é preciso atentar para a escassez de água do percurso.

Peguei o ônibus "Divisa de Ubatuba" às 7h10 em Paraty e saltei no ponto final, em frente à Cachoeira da Escada, na rodovia Rio-Santos, às 7h46. Exatamente ali desce a estrada de asfalto e terra para a Praia de Camburi, a última do estado de São Paulo. Tirei algumas fotos da cachoeira e comecei a descida em direção à praia atento ao nome das ruas. Desci apenas 1,6km e (bem antes de chegar à praia) entrei na Rua Vitória Felipe dos Santos Soares, à esquerda. Havia dois moradores na esquina e só para comprovar o que todos dizem, perguntei a eles sobre a trilha para Trindade. A resposta foi a esperada: ninguém consegue, todos se perdem e voltam, ninguém consegue passar de tal ponto, blá blá blá. Mas com um guia local tudo é possível. Sim, pois os moradores do Camburi são ungidos de um poder que ninguém mais tem de encontrar caminhos misteriosos na mata. Além disso, são protegidos por entidades que não os deixam ser devorados pelas onças que habitam o local. Todas essas bobagens tive de ouvir.

Imagem
Grandes árvores

Nem perguntei a eles onde ficava o início da trilha pois deviam me mandar para algum lugar errado para eu desistir também. Entrei na tal Rua Vitória Felipe dos Santos Soares, cruzei uma ponte com convidativos poços para banho e na subida passei por uma placa de "propriedade particular - proibida a entrada de pessoas não autorizadas". Apenas 130m depois da ponte notei uma trilha larga subindo à direita, mas na dúvida resolvi explorar mais à frente. Atenção: é exatamente aí que se deve subir, nessa trilha larga subindo à direita. Mas eu continuei em frente e encontrei algumas casas, onde uma moradora não sabia informar nada de nada. A trilha continuava atrás da casa dela e descia a um riacho, que cruzei e subi, subi, indo parar na estrada de acesso à praia, a mesma pela qual comecei a caminhada. Esse caminho pode portanto servir de atalho (mas tem o inconveniente de passar literalmente na porta de uma casa).

Voltei àquela "trilha larga subindo à direita", agora à esquerda, e subi até o topo (nem 100m), onde há uma clareira e uma trilha que se enfia no mato à esquerda. Mas só a observei e continuei em frente. Desci na direção de algumas casas e bati palma. Fui atendido pelo Ednaldo, um rapaz muito prestativo que me indicou o início da trilha, que era justamente ali atrás, junto à clareira do topo, uns 70m antes da casa dele. Ele me disse que a trilha estava boa até um local chamado de "laminha", depois não sabia informar.

Já alertado sobre a presença de peçonhentas, calcei as perneiras e comecei a travessia enfim às 9h34 (113m de altitude). Em 6 minutos encontrei uma clareira onde caberiam umas cinco barracas. A trilha continua à direita dessa clareira. Às 9h46 ela entroncou em outra trilha que vinha da esquerda, o que não causa nenhuma dúvida na ida, mas pode confundir na volta. Mais 6 minutos e subi uma pedra-mirante do lado esquerdo para fotos das montanhas. Da trilha, algumas aberturas na mata proporcionaram as últimas vistas da Praia de Camburi, lindamente iluminada pelo sol daquela manhã.

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Praia de Camburi - Ubatuba

Às 10h11, topei com a primeira das bifurcações citadas nos relatos que li - fui para a esquerda e encontrei um trechinho de lama, que deve ser a laminha que o Ednaldo citou. Ele também disse que dali haveria uma trilha alternativa para o Camburi, mas não a encontrei.

Às 10h34, logo após um laguinho raso à esquerda, uma bifurcação crucial, muita atenção a ela. Indo direto ao ponto: o caminho certo é para a esquerda. Mas eu descobri isso depois de várias tentativas e erros. Para ter certeza desse local, há uma seta gravada no tronco de uma árvore próxima, é só procurar com atenção. A altitude é de 310m nesse ponto.

Nessa bifurcação, os relatos me deixaram em dúvida e eu escolhi a direita (sudeste). Dei alguns passos e topei com outra bifurcação, essa mais discreta. Dúvida de novo. Fui para a esquerda e encontrei marcas de facão, o que me animou. Mas a alegria durou pouco pois a trilha sumiu. Voltei e fui para a direita na última bifurcação. A trilha, inicialmente meio fechada, começou a descer e topei com uma grande árvore caída, que contornei pela esquerda. A trilha continuou bem batida, mas não gostei da direção que estava tomando (sul), diretamente em direção ao mar. Quando comecei a ouvir o barulho da arrebentação e vi que ia descer quase 300m de desnível até o mar, resolvi voltar. Foi uma decisão acertada pois encontrei um caminho ótimo depois, porém esse pode até ser outro acesso para Trindade, algo a ser conferido num futuro próximo.

Subi de volta à bifurcação "crucial" e tentei a última alternativa: para a esquerda (nordeste). Já eram 12h16. Daí em diante foi uma boa subida, mas a trilha se manteve sempre muito nítida e completamente desimpedida. Apenas bambuzinhos e plantas espinhentas que se projetavam no caminho exigiam cuidado para não se cortar ou ralar os braços e mãos. Às 12h53 uma concentração de folhas de bambu no chão embaralhava um pouco o caminho, mas nada complicado. Às 13h28 finalmente encontrei água e parei para um lanche.

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Marco de concreto da divisa de estados

Pouco depois da pausa para o lanche, atingi o ponto mais alto da travessia, a 416m de altitude, e às 14h40 alcancei o marco de concreto da divisa de estados, me dando a certeza de que estava no caminho certo (277m de altitude).

O marco está sendo engolido pelo terrível bambuzal citado nos relatos, mas consegui passar e continuar sem problema já que a trilha segue bem batida à direita dele, ainda livre do bambuzal. Desci muito e às 15h30 topei com uma bifurcação perto de um riacho. Deveria prosseguir à direita, porém as mangueiras pretas ao longo da trilha denunciavam a captação de água mais acima e as segui, indo para a esquerda e parando no riacho para descanso e mastigar algo.

Saí do riacho às 15h58 e foi só descer pela trilha acompanhando a água e suas bonitas quedas (do lado esquerdo) para chegar ao ponto final da travessia, nos fundos do Camping das Bromélias, na Praia do Caxadaço, às 16h14. Ainda deu tempo de curtir a piscina natural do Caxadaço, alcançada por uma trilha de 500m a partir do canto direito da praia.

Com os perdidos, levei o dia todo para fazer essa travessia, mas sabendo o caminho correto poderia fazê-la novamente em 5h30, contando desde a Cachoeira da Escada, na rodovia Rio-Santos, até a Praia do Caxadaço, em Trindade. Distância de 7,5km.

Agradeço ao Rodrigo, como já disse, e ao Thunder por disponibilizar as coordenadas do marco de concreto da divisa, que foi o meu norte. As onças da mata que iriam me almoçar... bem, essas não quiseram dar o ar da graça, talvez pelo calor terrível que fazia. Quem sabe na próxima...

Imagem
Piscina natural do Caxadaço - Trindade

Informações adicionais:

Horários de ônibus:
Paraty-Divisa de Ubatuba:
seg a sáb - 5h30, 7h10, 9h50, 12h30, 14h10, 15h15, 16h40, 18h10, 20h50
dom - 7h, 9h50, 12h30, 15h15, 18h10

Paraty-Trindade:
diariamente - 5h20, de hora em hora das 6h até 19h, 20h30, 22h30

Trindade-Paraty:
diariamente - de hora em hora das 6h até 19h, 19h40, 21h15, 23h15

Cartas topográficas:
. Picinguaba - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualiza ... -C-I-3.jpg
. Juatinga - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualiza ... -C-I-4.jpg

Rafael Santiago
dezembro/2012

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Trilha marcada na imagem do Google Earth