terça-feira, 21 de maio de 2013

Circuito de trilhas no sul de Floripa (SC) - mai/13

ImagemPraia da Solidão

As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/CircuitoDeTrilhasNoSulDeFlorianopolisSCMai13.

O tracklog está em www.mochileiros.com/circuito-de-trilhas-no-sul-de-floripa-sc-mai-13-t82660.html.

1º DIA: DE PÂNTANO DO SUL A NAUFRAGADOS, CAIEIRA DA BARRA DO SUL E PERNOITE NO PASTO DE VOLTA AO SAQUINHO

No Terminal Central - TICEN (ao lado do mercado municipal, no centro de Floripa) peguei às 7h57 o ônibus "Rio Tavares-direto" (nº 410), que chegou ao Terminal de Integração Rio Tavares (TIRIO) às 8h13. Ali mesmo, sem pagar outra passagem, peguei o ônibus "Pântano do Sul", que saiu às 8h30 e chegou às 9h ao ponto final, na Costa de Dentro. A enseada do Pântano do Sul é dividida em três partes: a vila de Pântano do Sul propriamente dita, na extremidade leste, o Balneário dos Açores, com casas e prédios novos e de padrão mais elevado, e a Costa de Dentro, um bairro que parece ser um pouco mais antigo também, na ponta sudoeste da enseada. O ponto final do ônibus, como disse, foi na Costa de Dentro.

Ajeitei a mochila e comecei a caminhar às 9h09 na direção do final da rua (cerca de 50m), onde há uma bifurcação e um totem com diversas placas coloridas indicando praias e pousadas. Segui a placa da Praia da Solidão e fui para a esquerda, entrando na Rua Lauro Mendes. Menos de 150m depois um outro totem de placas coloridas me manda entrar na rua à direita, a Rua Inério Joaquim da Silva, que deixa o bairro e vira uma estrada de asfalto que sobe bastante e desce já na Praia da Solidão. Dei uma olhada na praia, completamente deserta apesar do sábado de sol, e aproveitei para calibrar o altímetro do gps. Voltando à rua principal do bairro, vi no final de uma rua à direita uma placa de "cachoeira" e entrei. Essa placa mandava entrar à direita de novo e outra em seguida apontava um caminho à esquerda, que cruzou um riacho pelas pedras e virou uma trilha na mata. Segui por ela por uns 400m e só encontrei o Rio das Pacas descendo entre grandes pedras, onde a trilha aparentemente terminava. Dali para cima havia apenas um conjunto de mangueiras de captação de água. Pensei comigo: mais um rio com pequenas quedas que chamam aqui de cachoeira. Mas parece que eu estava enganado. Depois me disseram que eu teria que subir mais para encontrar uma cachoeirinha de verdade, com poço e tudo. Ficou para a próxima.

Voltei à rua principal, que logo começa a subir e cujo calçamento vira duas faixas paralelas de concreto. Passo pelas últimas casas às 10h13 e o caminho se reduz a uma faixa de concreto apenas, que é a "trilha" para a Praia do Saquinho. Essa trilha concretada causa um certo estranhamento, mas acredito que seja melhor assim pois evita a erosão da encosta e melhora a circulação dos moradores já que o trajeto é bem íngreme em alguns pontos, chegando a 90m de desnível.
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Praia do Saquinho

No final da descida entrei numa rua à esquerda e fui ver a Praia do Saquinho, que é minúscula e cheia de pedras. Alguns moradores pescavam no costão na outra ponta. Voltei à trilha concretada, que terminou na vila às 10h52. São bem poucas casas, algumas de madeira, uma autêntica vila de pescadores ainda.

Ali tentei obter informações sobre a condição das trilhas para Naufragados e Caieira da Barra do Sul, mas o morador só confirmou o que eu havia lido, que as trilhas caíram em desuso e estavam tomadas pelo mato. Pura besteira. Só um trechinho da trilha para Caieira é que está fechado, como pude comprovar depois. São as bobagens da crendice popular, como já me havia acontecido na travessia Camburi-Trindade (lá é ainda pior por causa do intere$$e dos guias locais). Depois dos costumeiros avisos de trilha complicada e muitas cobras pelo caminho, dei continuidade à minha caminhada.

Sabia que se quisesse ir direto para Naufragados deveria me manter próximo ao mar para fazer todo o contorno do sul da ilha, e se quisesse ir para Caieira deveria encontrar uma trilha à direita que cortasse a ilha no sentido oeste até o outro lado já que essa praia fica voltada para o continente. Como não encontrava a tal trilha para a direita, fui seguindo junto ao mar. Às 11h30 uma estrutura de madeira grossa à direita da trilha me chama a atenção. São os restos de um antigo engenho e próximo a ele um forno de barro em forma de iglu. Relíquias do passado colonial da ilha que estão abandonadas e sofrem com o vandalismo.
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Praia de pedras à direita do Pastinho

Continuando pela trilha batida e sem dificuldade alguma, passei por dois pontos de água (a única água fácil do dia, sem contar obviamente a que se pode comprar nos bares das praias), um pé de mexerica carregado, uma cerca com passadiço e às 12h47 chego à Ponta do Pasto, mais conhecido como Pastinho. O lugar é bem bonito e interessante, uma ponta de capim e rochas que se projeta entre o costão rochoso ao norte e uma praia de pedras ao sul. Bem em frente as Ilhas Três Irmãs. À esquerda, mais ao norte, se vê a ponta montanhosa que fica a leste do Pântano do Sul e à direita, bem distante, a Praia da Pinheira, no continente. O local ainda é usado como pastagem de gado, mas não deixa de ser um bom ponto de acampamento, embora sem água próxima.

A continuação da trilha aponta para a mata e daqui em diante ela se afasta um pouco do mar. Começa já com uma subida forte. Numa bifurcação com um plástico branco preso num tronco, às 13h24, resolvi ir para a direita e subir mais (e acabei não explorando o ramo da esquerda). A travessia até Naufragados atinge então o seu ponto mais alto, 172m de altitude. Descendo um pouco chego às 13h50 a uma bifurcação importante, mas sem nenhuma sinalização: à esquerda a Praia de Naufragados e à direita um dos três caminhos que se juntam para o acesso entre Naufragados e Caieira da Barra do Sul (os outros dois são pelo Restaurante Golfinho e pelo farol de Naufragados). Fui para a esquerda e notei a trilha bastante roçada, e coisa bem recente.

Logo encontrei um casal na trilha e eles me disseram que aquele trecho tinha sido roçado para uma prova que estava para acontecer. Talvez por isso eu não tenha pego a trilha com mato em nenhum momento.

Às 14h22 outra bifurcação. Tudo indicava que eu deveria descer à direita, mas fui explorar o ramo da esquerda primeiro, que termina no costão, onde há uma casa isolada. Valeu pela vista do farol, na outra extremidade da praia. Infelizmente o tempo havia mudado e o céu estava cinzento, com muito vento, ameaçando chover a qualquer momento. Voltei à bifurcação e às 14h39 cheguei à Praia de Naufragados, que continua bastante preservada, com algumas casas escondidas no meio da vegetação.
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Praia de Naufragados

Cruzei seus 700m de areia batida e subi as pedras do canto direito para alcançar uma trilha logo acima que leva ao farol, mas no caminho uma placa aponta para os canhões à direita e subi lá primeiro. São três canhões que apontam para a entrada da Baía Sul da Ilha de Santa Catarina, cada um fixado a uma plataforma circular de concreto, sendo o pouco que restou do antigo Forte Marechal Moura de Naufragados, construído entre 1909 e 1913. Com mais atenção nota-se no fundo de cada plataforma o respectivo corredor entrincheirado, usado para movimentar a munição, e que os três corredores convergem para o mesmo ponto, onde a munição era distribuída. Infelizmente esses corredores estão atualmente tomados pelo mato.

Depois visitei o farol, de 1861, bem mais baixo do que eu imaginava. Uma plataforma de madeira ao lado dele permite ver a Ilha de Araçatuba com as ruínas da Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Araçatuba, de 1742, e à direita a Praia do Sonho, no continente. A fortaleza foi durante muito tempo a única fortificação destinada a proteger a entrada da Baía Sul da ilha, até a construção do Forte Marechal Moura, 167 anos depois. Terminei o passeio com uma rápida visita ao antigo porto, um velho trapiche de pedra com a Praia do Sonho bem em frente.

Esses três atrativos da Praia de Naufragados estão bem sinalizados nas bifurcações, porém estranhamente o caminho para Caieira não, o que deixa alguns visitantes em dúvida. Saindo do farol, basta pegar a esquerda na primeira bifurcação (a direita vai para a praia de Naufragados) e a direita na segunda (a esquerda vai para o porto). Uns 200m depois, numa bifurcação sem placa, deve-se ir para a esquerda (a direita leva aos canhões). Eram 16h04 quando deixei Naufragados. A trilha atinge o ponto mais alto na cota dos 146m. Nas outras duas bifurcações do caminho, basta ir para a esquerda. Essa última bifurcação é a junção das três trilhas para Caieira que mencionei.

Na descida final para Caieira a trilha atravessa alguns pastos e sofre com muita erosão. Uma placa depredada bem no começo da trilha informa que a área faz parte do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, que abrange a ponta sul da Ilha de Santa Catarina e as Ilhas Três Irmãs, entre outras.
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Ilha de Araçatuba com as ruínas da Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Araçatuba, de 1742

A trilha termina/começa entre dois grandes terrenos usados como estacionamento e ali, às 17h, procurei informação sobre o caminho direto de volta à Praia do Saquinho. Estava a 35m de altitude.

Ao lado do estacionamento da direita, caminhei pelo pasto sem uma trilha muito bem definida e atravessei uma sequência de três colchetes. Passei por algumas casas e a trilha terminou numa rua de terra que subia da avenida da praia. Subi então à direita, atravessei uma porteira e passei pela última casa da rua, de cor salmão. A rua de terra continuou subindo forte e alcançou um pasto, onde um homem muito mal-humorado que tratava das vacas me disse que a trilha para o Saquinho era difícil, mas me deixou cruzar o seu terreno (deve ter pensado: deixa esse sujeito se lascar). Atravessei um colchete e encontrei a trilha bem marcada já que leva a outro pasto mais acima. A subida é forte de novo e olhando para trás vão se acendendo as luzes de Caieira e da Praia do Sonho, no continente. Atravessei mais dois colchetes e no terceiro, com um curral coberto de telhas à esquerda, alcancei às 18h o outro pasto, que tinha como referência já que fica bem na crista, dali seria só descer para o lado leste da ilha. Como quase já não havia luz natural, tratei de arranjar um lugarzinho plano para montar a barraca. As vacas estavam por ali mas não chegaram nem perto e a chuva que ameaçou cair a tarde toda felizmente não veio. Altitude de 258m.

Na parte mais baixa desse pasto há uma nascente mas é melhor purificar a água ou fervê-la para o consumo.

Nesse dia caminhei 17,1km.
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Caieira da Barra do Sul

2º DIA: DO PASTO À LAGOINHA DO LESTE E À PRAIA DA ARMAÇÃO, COM DIREITO A MUITA CHUVA E VENTO

Desmontei acampamento logo cedo e comecei a caminhar às 7h20. Do alto desse pasto onde acampei podia ver o mar dos dois lados da ilha. Desci pela calha natural do pasto no sentido leste e no final dele encontrei uma cerca que tive de cruzar por baixo, logo depois da nascente de água que mencionei. Após a cerca a trilha continua, mas depois de uns 300m começa a ficar mal definida. Numa primeira bifurcação tanto faz ir pela direita ou esquerda, são variantes, mas na segunda, poucos metros depois, deve-se descer à direita, passando por baixo de outra cerca. Se estiver sem água, é só caminhar uns 60m para a esquerda nessa bifurcação.

Menos de 50m depois dessa segunda cerca, a trilha desaparece, engolida pelo mato alto (de cerca de um metro de altura). Desci por 150m pelo caminho que parecia ser o menos ruim e acabei reencontrando a trilha. Após cruzar um riacho ela volta a ficar bem batida, até que alcanço a trilha Saquinho-Pastinho, percorrida ontem, exatamente no local do antigo engenho e do forno de barro, às 8h40. Procurei essa trilha ontem a manhã toda e me distraí justo no momento em que ela estava ao meu lado. Mas acho que foi melhor assim pois até então não tinha informações confiáveis sobre ela.

No retorno ao Pântano do Sul, passei pela vila do Saquinho às 9h, pela Praia da Solidão às 9h30 e cheguei ao ponto de ônibus da Costa de Dentro às 9h51. Descansei e mastiguei alguma coisa e às 10h10, ignorando o tempo fechado, dei início à segunda caminhada, a travessia dali até a Praia da Armação tendo como principal atrativo a Praia da Lagoinha do Leste.

Optei por caminhar pela avenida principal do bairro em vez da praia para conhecer melhor o lugar e ver como está diferente de quando eu andei por ali, muitos anos atrás, principalmente por causa do tal Balneário dos Açores. Mas ainda há dunas e vegetação preservada mais próximo da vila do Pântano do Sul.
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A Praia da Lagoinha do Leste é parque municipal desde 1992

A avenida terminou no final da rodovia SC-406 (por onde cheguei do centro de Floripa ontem). Dali bastou quebrar à esquerda por 120m e entrar na segunda rua à direita, bem em frente à portaria azul e branca do condomínio Caravellas IV Residence. A rua estreita vira uma ladeira íngreme mas em 100m uma placa amarela à esquerda aponta o início da trilha para a Praia da Lagoinha do Leste, informando que se trata de um parque municipal, ou seja, uma unidade de conservação. Uma outra placa meio apagada informa que a trilha tem 2361m de extensão (medi 2,2km com o gps).

Entrei na trilha às 10h54 me deparando com bastante erosão, grandes pedras e raízes expostas, denunciando que ela é bastante frequentada. E é isso mesmo, apesar do tempo feio cruzei com muita gente, grande parte carregando sua prancha de surf. Às 11h18 passei pela chamada Estação Curso d'água, uma fonte à esquerda da trilha, e às 11h34 alcancei a bifurcação da Estação Platô, onde dois deques de madeira a 187m de altitude servem como mirante para as praias de Pântano do Sul de um lado e Lagoinha do Leste do outro. Um deles é coberto e o outro não, talvez este tenha tido a cobertura depredada, assim como as tábuas do piso de ambos estão sumindo também. O tempo estava piorando e o vento vindo do mar já trazia garoa até ali.

Continuando, a trilha atravessa uma mata alta e atinge seu ponto mais alto na cota dos 207m para imediatamente começar a descer. Cruzei mais um bando de gente subindo de volta por causa do tempo e a chuva não tardou a chegar, me obrigando a acelerar um pouco para não pegar a trilha íngreme ainda mais escorregadia. Cheguei enfim à Praia da Lagoinha do Leste às 12h26 e me abriguei numa cabana-bar bem no final da trilha. O teto era de palha e pingava para todo lado, mas fiz um lanche ali assim mesmo.
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Praia de Pântano do Sul vista do mirante na trilha para Lagoinha do Leste

A chuva ia e vinha sem sinal de trégua e fui ficando ali, diante da praia deserta. A única movimentação acontecia na entrada na mata nos fundos da cabana onde eu me abrigava. Me veio à lembrança a história do morador solitário da Lagoinha, o Michael (Maicol), e logo alguém me disse que ele estava ali pois estava cuidando do bar que funciona na cabana. Fui convidado a me abrigar na grande lona estendida e aceitei. Conheci assim o Michael, muito gente boa, que contou um pouco da sua singular trajetória. Ele mora sozinho ali na Lagoinha há 20 anos! Mas gosta de receber visitas e dá atenção a todos. O seu acampamento não é aquele, mas mesmo assim fazia questão de que todos ficassem à vontade e se servissem do que ele tinha para comer e beber, presente do pessoal que visitou a praia e foi embora mais cedo por causa do mau tempo. Ele disse que de vez em quando vai a Pântano do Sul comprar mantimentos e ver gente, mas não se demora, e que o inverno é uma época difícil por causa da solidão e isolamento, já que ninguém aparece na praia por um bom tempo. É uma forma de viver e compreender a vida que, se não desperta a vontade de fazer o mesmo (algo bem difícil de acontecer), pelo menos leva a uma reflexão do que é essencial e de como são infinitas as possibilidades de tocar a própria vida. Para quem está acostumado à vida massificada das grandes cidades, isso soa apenas como mais uma loucura, mas é interessante se deter um pouco sobre o assunto e refletir.

A chuva não arredava pé mas já era hora de eu prosseguir a caminhada. Infelizmente meu retorno à Lagoinha do Leste depois de quase 20 anos não ocorreu no melhor dos dias. Me despedi do Michael e seus amigos e caminhei até a outra extremidade da praia para pegar a trilha para a Praia do Matadeiro. No caminho, entrei em duas trilhas nas dunas para observar de longe a lagoa mas o dia feio não empolgava para fotos. Alcancei o fim da praia e o início da trilha às 14h27.

Ao contrário da trilha que vem de Pântano do Sul, que sobe e desce um grande morro no sentido oeste-leste, a trilha para Matadeiro acompanha todo o contorno do costão ao norte, a princípio a céu aberto depois por dentro da mata.

A trilha sobe bastante no começo com algumas variantes e bifurcações. Descobri que o caminho mais usado seguia pela esquerda numa primeira bifurcação e à direita na segunda, atingindo o topo do morro, onde uma outra trilha bem batida desce um pouco e acompanha o costão mais ou menos em nível (sem subir nem descer quase). A visão do mar verde e profundo se chocando nas imensas pedras é muito bonita mesmo, pena estar chovendo...
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Praia da Lagoinha do Leste

Depois a trilha passa a correr por dentro da mata alta, com pouca visão do mar, e cruzo dois pontos de água em sequência por volta de 16h23. Acelerei o passo pois com o tempo fechado iria escurecer logo no meio da mata, e cheguei enfim à areia da Praia do Matadeiro às 16h54, após percorrer no finalzinho uma trilha concretada igual à da Praia do Saquinho. Caminhei os 700m da Praia do Matadeiro, que é bem curiosa pois não tem ruas e acesso a carros, e ao fundo, atrás das casas, há uma encosta de pasto onde cavalos pastavam. Só alguns destemidos surfistas curtiam o mar na extremidade norte, junto à Ponta da Campanha.

O único acesso ao Matadeiro é feito por uma trilha de concreto (mais uma!) que começa na ponte sobre o Rio Sangradouro, que a separa da Praia da Armação.

Peguei então a trilha de concreto, cruzei a ponte e fui para a esquerda e depois primeira à direita, alcançando no final da rua a igreja do bairro da Armação, em frente ao mar, onde já havia passado de ônibus na manhã anterior. Num instante, peguei o ônibus no ponto do lado direito da igreja (confirmando que ele seguia para o centro mesmo) e refiz o esquema de descer no terminal TIRIO, pegar o "410 - Rio Tavares-direto" e descer no terminal central, ao lado do mercado municipal, no centro de Floripa. E a chuva castigando.

Nesse dia caminhei 10,3km até a Praia da Lagoinha do Leste, depois disso parei de registrar.

Informações adicionais:

Horários de ônibus (tarifa de R$2,90):
. Rio Tavares - direto (nº 410): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=410%20%20%20&menu=2
. Pântano do Sul (nº 564): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=564%20%20%20&menu=2
. Costa de Dentro (nº 563): www.pmf.sc.gov.br/servicos/index.php?pagina=onibuslinha&idLinha=563%20%20%20&menu=2

Carta topográfica de Paulo Lopes: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-4.jpg

Rafael Santiago
maio/2013

Percurso na carta topográfica - parte 1

Percurso na imagem do Google Earth - parte 1

Percurso na carta topográfica - parte 2

Percurso na imagem do Google Earth - parte 2

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Travessia do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro (SC) - abr-mai/13

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Face sul do Pico do Tabuleiro


As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaDoPqEstDaSerraDoTabuleiroSCAbrMai13.

O tracklog está em www.mochileiros.com/travessia-do-pq-est-da-serra-do-tabuleiro-sc-abr-mai-13-t82426.html.

O Parque Estadual da Serra do Tabuleiro foi criado em 1975 e é a maior unidade de conservação do estado de Santa Catarina. Apesar disso, ocupa apenas 1% do território do estado. Sua área de 841,3 km2 ocupa parte do território dos municípios de Florianópolis, Palhoça, Santo Amaro da Imperatriz, Águas Mornas, São Bonifácio, São Martinho, Imaruí e Paulo Lopes, ou seja, a diversidade de biomas é grande, indo desde os campos de altitude do interior até as restingas e manguezais do litoral e das ilhas. Quem caminha pelas trilhas do sul da Ilha de Santa Catarina sabe pelas placas (enquanto não acabarem de depredar todas) que está andando também pelo PE da Serra do Tabuleiro, que é administrado pela FATMA (Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina).

Meu primeiro contato com esse parque foi através da revista Aventura & Ação, edição nº 132 (sem data, mas provavelmente de janeiro de 2006). Porém a linha editorial da revista não é de publicar roteiros detalhados e, sem as informações necessárias, a idéia ficou guardada por um bom tempo. Diga-se de passagem, na matéria o relato dessa travessia é extremamente superficial.

Quando resolvi voltar a pesquisar sobre a travessia do parque, encontrei pouco material na internet, algumas fotos, mas achei os arquivos para gps de que precisaria, com vários pontos marcados. Já tinha assim o suficiente para me aventurar por mais essa região desconhecida para mim. Porém não contava em encontrar tanta dificuldade na segunda metade da travessia, com muitos trechos de mata alta e fechada que se deve atravessar sem trilha, varando mato mesmo, se enroscando e se arranhando todo. Somado a isso, próximo ao pico, mesmo a vegetação arbustiva é alta e compacta e dificulta cada passo dado, sendo impossível encontrar algum rastro de trilha, se é que existe algum. O melhor mesmo é fazer essa travessia em grupo e com pelo menos um facão para, num trabalho em equipe, localizar a possível trilha de aproximação do pico e reabri-la.

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Pico do Tabuleiro visto da rodovia BR-282, no posto Ipiranga do trevo de São Bonifácio

DIA O - DE FLORIPA AO INÍCIO DA TRILHA

Peguei o ônibus das 12h10 da empresa TCL na plataforma 5 do terminal da Praça 15 de Floripa com destino à pequena cidade de São Bonifácio. Durante a semana só há dois horários por dia dessa linha, o outro sendo às 17h50, bastante inconveniente para quem pretende fazer a travessia (a sugestão nesse caso seria dormir na Pousada das Hortênsias, a mais próxima do início da caminhada, mas não sei dizer o preço da diária). O atencioso motorista, ao saber que eu iria descer na estrada, perguntou para que local eu estava indo, e para minha tranquilidade ele conhecia tanto a entrada da Fazenda Weber quanto a do sítio do Gilson e Inês Hawerroth, os dois possíveis acessos à Serra do Tabuleiro pelo sul, sendo este último o meu destino. Depois de circular por todos os bairros possíveis e imagináveis das cidades do caminho, e até rodar por uma estrada de terra em plena mata, consegui saltar do ônibus azul às 14h55. Por sorte havia um ponto coberto na estrada pois o céu cinzento que havia se formado na última hora resolveu se transformar em chuva, o que me segurou por mais de uma hora ali abrigado. Esse ponto de ônibus fica 4km antes do centro de São Bonifácio e tem como referência uma placa marrom que indica os atrativos da localidade para onde eu me dirigia: Rio Moll, Recanto das Pedras e Travessia da Serra do Tabuleiro. Sim, por incrível que pareça, essa árdua caminhada (por conta da falta de trilha definida e dos muitos vara-matos, como disse) está escancarada ali numa placa de turismo à margem da rodovia, como se fosse um atrativo turístico igual aos outros.

Enfim dei início à pernada às 16h04 atravessando a SC-431 e tomando a estrada de terra bem em frente. A altitude é de 436m e a paisagem é toda rural, com pastos, vacas para todo lado e uma concentração de umas dez casas que atravessei após cruzar a ponte de madeira sobre o Rio Capivari e tomar a esquerda na bifurcação. A estradinha acompanha o Capivari (à minha esquerda) durante algum tempo mas logo se distancia dele e das casas e vai encontrar o Rio Moll mais à frente, correndo à direita. Esse rio, afluente da margem esquerda do Capivari, será uma referência durante toda a primeira parte da travessia pois percorrerei seu vale florestado em direção à sua nascente até o momento certo de subir a Serra do Tabuleiro.

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Uma das 16 travessias do Rio Moll

Às 17h10 alcancei o fim da estrada exatamente na frente da casa do Gilson, onde bati palma (altitude de 600m). Fui recebido por sua esposa, Inês, que me deu informações rápidas sobre o local e sobre o começo da trilha. "Não acampe perto do rio, ele é muito perigoso", recomendou fortemente ela, acrescentando que eu iria cruzar o Moll 13 ou 14 vezes, para minha surpresa (na verdade, foram 16 vezes).

O começo da trilha é bem ali do lado esquerdo da casa, não tem erro. Pelo horário eu sabia que logo teria que encontrar um local para montar a barraca, mas assim mesmo quis adiantar algumas centenas de metros ainda nesse dia e não quis pedir para acampar no quintal deles. A trilha imediatamente entra na densa mata ciliar e começa a cruzar o rio a cada poucos minutos, pelas pedras. Não há grande dificuldade mas um bastão ou cajado ajuda bastante, então tratei logo de arranjar um pedaço de tronco como cajado. Às 18h06, quase sem luz natural no meio da mata, encontrei um espacinho plano e pouco úmido para pernoitar. Já havia cruzado o Moll 3 vezes.

O céu no cair da noite continuava encoberto, com possibilidade de mais chuva, e a água que caía das árvores deixava tudo completamente molhado. Altitude de 666m.

Nesse dia caminhei 5,5km.
Zoom in (real dimensions: 720 x 404)ImagemPrimeira visão do Pico do Tabuleiro, ainda bem distante, à direita (o de topo mais chapado)

1º DIA - DO RIO MOLL AO MIRANTE DE FLORIPA

A luz natural demorou um pouco para penetrar o vale e a mata, o que me tomou algum tempo para saber se a chuva do dia anterior iria atrapalhar o meu primeiro dia de travessia ou não. Felizmente um sol forte deu as caras e os ânimos se renovaram. Nessa expectativa, acabei saindo tarde, às 9h35.

O Rio Moll, como disse, é uma referência constante pois a rotina da manhã toda foi cruzá-lo a cada 5 ou 10 minutos de trilha, mas sempre pulando pedras, sem necessidade de tirar as botas (uma boa bota impermeável vem bem a calhar nessas horas). Depois de atravessá-lo 12 vezes (contando desde o dia anterior) saio desse primeiro longo trecho de mata às 10h45 e encontro um pasto com vacas. A sequência agora passaria a ser essa: mais uma florestinha, outro pasto, cruza o rio, e assim por diante.

No quarto pasto, depois de atravessar o Moll 16 vezes, é hora de ficar atento. A tendência natural da trilha (de bois) é atravessá-lo mais uma vez, e foi o que eu fiz. Porém encontrei logo à frente a trilha toda tomada por um rio largo e raso. Percebi que havia passado um pouquinho do ponto onde se inicia a subida da serra. Cruzei o Moll de volta e fui para a esquerda pelo pasto, na direção da floresta, tendo o rio bem à minha esquerda. A altitude é de 774m e nesse momento a direção geral da travessia, que vinha sendo basicamente norte, quebra para leste. Ali na borda da floresta, às 11h27, encontrei facilmente a trilha que a penetra e sobe bastante sob a sombra das árvores. Dois minutos depois de um colchete, abasteci os cantis no riachinho pois seria a minha última água fácil do dia.

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Subindo o Morro das Pedras

A trilha sai no aberto às 11h59 e já é possível contemplar os morros e vales ao redor, embora ainda na modesta altitude de 865m. Na sequência, mais subida com samambaias e mais dois segmentos de mata até que se atinge o alto da serra, onde... vacas pastam! Quebra um pouco o clima de montanha, fazer o quê, mas é isso mesmo, grande parte dos caminhos dessa travessia são trilhas de boi que tomamos e abandonamos de acordo com a direção e conveniência.

Logo descobri também que parte do terreno é formada por turfeiras, que são uma vegetação "esponjosa", rosada ou avermelhada, que acumula água e que é o terror de quem faz travessias na Serra Geral de SC e RS por significar solo encharcado e cansativo para caminhar. Mas aqui elas são bem menos frequentes, felizmente.

No alto da serra, o pano de fundo para o tranquilo pastar bovino é uma cadeia montanhosa que surge a nordeste, com uma bela sequência de discretos picos que me traz uma boa novidade: a primeira visão do Pico do Tabuleiro, com seu característico topo chapado, ainda bem distante (cerca de 9km em linha reta), mas como um objetivo ao alcance do olhar.

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No topo do Morro das Pedras

Continuando a subida seguindo sempre os caminhos bovinos mais marcados, atinjo às 14h30 um ponto bastante alto e aberto (1209m) onde há sinal da Vivo e Claro para poder dar um alô em casa depois de muitos dias sem contato. Aproveitei para um descanso e um lanche também. À minha frente (noroeste) já vejo o Rio Moll correndo dentro de um profundo vale. Desse ponto já avisto também bem próximo (nordeste) o Morro das Pedras, aonde chego às 16h25.

O Morro das Pedras é uma crista formada de capim baixo, lajes e grandes blocos de pedra, a 1269m de altitude, com visão de 360º de serras distantes, e de onde se divisa a cidade de Florianópolis pela primeira vez na travessia, a nordeste.

Ultrapassado o topo do Morro das Pedras a trilha desce suavemente contornando-o pela esquerda e em menos de 400m (após o topo) há uma bifurcação pouco perceptível no capim. O caminho natural da travessia vai para norte/nordeste (esquerda na bifurcação), mas a descida até o vale à direita (leste) é bastante interessante pois sobe a seguir a um cocuruto de pedras de onde se avista Floripa de camarote, além do enorme vale do Rio Vargem do Braço à direita. A vista desse mirante estava tão inspiradora que resolvi acampar por ali mesmo e ter a oportunidade de contemplar as luzes da capital catarinense durante a noite. Altitude de 1227m.

Nesse dia caminhei 8,4km.

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Floripa vista do topo do Morro das Pedras

2º DIA - DO MIRANTE DE FLORIPA AO MINICÂNION

O feriado de 1º de maio amanheceu completamente fechado no alto da serra, a neblina não deixava enxergar mais que 50 metros ao redor. Junto aquela garoa fina característica. Sem condição nenhuma de navegação visual e também sem pressa alguma de terminar a travessia (estava de férias), enrolei a manhã toda para ver se o tempo melhoraria com o sol mais forte. E deu certo. Aos poucos a neblina foi se dissipando.

Com isso, acabei levantando acampamento somente às 13h40. Voltei pelo mesmo caminho até a bifurcação da tarde anterior e fui para a direita, descendo em direção a um riacho, uma das nascentes do Rio dos Porcos, onde parei para um lanche às 14h13. Retomando a caminhada às 14h42, acabo cruzando o mesmo córrego mais abaixo duas vezes e prossigo por um divisor de águas, com vales caindo para ambos os lados - nascentes do Rio Alto à direita e do Rio dos Porcos à esquerda. Subo um pouco e, contornando o morro à esquerda, desço a um vale e cruzo dois riachos, tributários de um outro córrego cujo vale se abre à minha direita (nordeste) e para onde os caminhos de boi me ajudam a seguir. Porém eles não me ajudam a descobrir o melhor ponto para atravessar duas faixas de mata sem trilha definida que aparecem a seguir.

Daqui em diante, os trechos de mata tornam-se ruins de passar pois lá dentro há caminhos de boi para todos os lados, e ao mesmo tempo há taquarinhas que enroscam em todo o corpo, na mochila, nos aparelhos pendurados (câmera, gps). Mas o que eu passei até aqui foi só uma pequena amostra do que ainda estava por vir.

O dia hoje não rendeu muito e logo depois da segunda matinha já era hora de montar acampamento, com a luz natural se esvaindo, às 18h. Altitude de 1018m.

Uma curiosidade: as águas desse vale onde acampei, ao contrário de quase todas as outras dessa travessia, juntam-se para descer a serra tomando o rumo leste num rio sem nome na carta que desemboca bem abaixo no Rio Vargem do Braço, o grande vale que avistei à direita no mirante de Floripa. Quase todas os outros córregos com que tive contato formam rios que descem a serra na direção oeste. Essas nascentes são a preciosa fonte de água para a Grande Floripa e litoral sul do estado, daí a importância da preservação do lugar.

Nesse dia caminhei 4,8km.

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Águas que vão para o vale do Rio Vargem do Braço

3º DIA - DO MINICÂNION AO COCURUTO VIZINHO AO PICO DO TABULEIRO

De manhã, com mais luz, é que notei quão profundo era o vale ao lado do meu acampamento, quase um pequeno cânion. Como disse, esse córrego é um dos que despencam serra abaixo na direção leste e ajudam a engrossar o Rio Vargem do Braço.

Comecei a caminhar às 8h40 e desci acompanhando o tal rio profundo até atravessá-lo facilmente pelas pedras depois de 17 minutos. Nessa descida, com o dia bem limpo (ao contrário de ontem), vou estudando o terreno à minha frente: uma muralha de morros bem altos com extensas faixas de floresta para complicar. Do ponto de vista que eu tinha tracei um caminho que me pareceu ser o mais desimpedido para a subida. No vale atravessei às 9h30 um bonito riacho com uma quedinha, abandonando com isso as trilhas de boi, que seguiam sem cruzar o riacho. Comecei a subir a encosta do alto morro sem trilha alguma, o que começou a me deixar ressabiado pois isso podia significar não estar num bom caminho. Porém, para minha surpresa, o gps confirmou esse trajeto. Pois bem, tanto eu quanto o gps estávamos errados pois aquele não era mesmo o melhor caminho. Devia ter seguido os bois e subido por uma outra encosta mais à esquerda (oeste). Aliás, essa é a proposta do tracklog do Hendrik Fendel (http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=3376898).

Esse caminho que eu tracei visualmente, e o gps confirmou, sobe muito, vara uma mata curta porém cerrada (com um plástico azul sinalizando uma entrada menos ruim) e chega ao topo do morro para em seguida... descer boa parte do que subiu atravessando uma florestinha meio complicada. Como se pode ver, um caminho bem ruim.

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Vale de uma das nascentes do Ribeirão Vermelho

De qualquer modo, por um caminho ou por outro, vamos atingir um riacho que é um dos formadores do Ribeirão Vermelho (aonde cheguei às 11h25), caminhar pouco mais de 200m bem junto a ele e abandoná-lo para subir a encosta da direita por trilhas de vaca ainda. Mas não sem antes encher todos os cantis pois seria a última água do dia.

Essa nova subida amplia muito a visão do horizonte em todas as direções e às 12h35 já tenho à direita (leste) um profundo e belíssimo vale que se abre lá embaixo no Rio Vargem do Braço, com um povoado e a torre de uma igreja. Para trás, é possível visualizar grande parte do caminho percorrido, desde o Morro das Pedras, pelo menos.

E subindo um pouco mais enfim surge à minha frente na cota dos 1222m o imponente e desafiador Pico do Tabuleiro, num ângulo em que o cocuruto que o acompanha fica à direita. Fiquei feliz por vê-lo finalmente, porém o que eu temia se concretizou: entre mim e ele um enorme e profundo vale recoberto de florestas. Qual caminho seguir? Muitas surpresas e perrengues estavam prestes a começar.

Mas antes uma boa surpresa, uma nova vista de Floripa, ainda mais próxima e mais bonita. Porém duas centenas de metros depois a má notícia: os trilhos e caminhos de boi desaparecem completamente, o que de cara torna a caminhada menos óbvia. Passo então a descer às 13h50 a encosta de gramíneas sem trilha alguma e na lenta aproximação com o pico um caminho vai parecendo o menos ruim: à direita, uma continuação natural da crista, porém mais baixa, serve como um selado ligando a montanha que desço ao maciço do Pico do Tabuleiro, mais exatamente ao cocuruto vizinho ao pico. Porém esse selado também não deixa de ter suas faixas de mata e trechos mais íngremes, ou seja, não seria um caminho fácil.

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Selado cheio de mata fechada que tive que atravessar sem trilha

Atinjo o ponto mais baixo do grande selado sem grande dificuldade (1059m), mas aí começam os fragmentos de mata. Como a chegada nessas matinhas se dá sem trilha alguma, perco algum tempo procurando uma entrada nelas que seja menos difícil e aponte para um possível caminho lá dentro com menos enrosco na vegetação cerrada, mas é praticamente em vão, não há mesmo um caminho, apenas vara-mato. Os quatro segmentos de mata do selado têm entre 40 e 200 metros de extensão cada um, mas fora deles também era difícil avançar pois a vegetação compacta de cerca de um metro de altura dificultava bastante cada passo.

Uma camiseta de manga longa aqui é uma ótima dica para não chegar ao pico e ao final da travessia com os braços pegando fogo de tão lanhados.

Após o quarto e último trecho de mata, o mais curto deles, termino de subir ao topo do cocuruto vizinho ao pico pelo capim baixo, porém com uma novidade, espinhentos gravatás, que insistem em espetar e cortar as pernas. Com o dia findando, às 18h, parei ali mesmo no alto do cocuruto e montei a barraca sobre um rastro de trilha que apareceu do nada. Altitude de 1206m.

De novo tive uma visão privilegiada da Grande Floripa à noite, com a extensa massa de luzes amarelas espalhadas pela ilha e pelo continente.

Nesse dia caminhei 6,7km.

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Nascer do sol na direção de Floripa

4º DIA - DO COCURUTO VIZINHO AO PICO DO TABULEIRO A CALDAS DA IMPERATRIZ

Do local onde acampei eu tinha o grande platô do Pico do Tabuleiro bem à minha frente, porém com um profundo vale nos separando, e, pior, forrado de densa floresta. Mas explorações na noite anterior deram esperança de haver uma tênue trilha por essa mata. Outro fator importante a considerar é que eu deveria transpor essa mata necessariamente na direção da língua de vegetação rasteira que desce do cume para tornar viável a ascensão do outro lado.

Desmontei a casa e parti às 7h31, adentrando a tal mata em menos de 100 metros. Dentro dela, procurando aqui e ali, um caminho foi se definindo e desceu bem forte e íngreme até um leito seco de rio. A primeira parte, portanto, já havia cumprido. Um pouco à direita, caminhando pelo leito seco, encontrei água parada porém limpa, que consumi sem problema. Restava encontrar a continuação do caminho para subir enfim a encosta do pico. Aí já não foi tão fácil. Não encontrei trilha e adentrei a calha de um outro córrego seco que parecia ir na direção desejada.

Aqui, sem trilha, sem visão nenhuma e tendo de alcançar a ponta da única faixa de vegetação baixa que desce do cume, tive de lançar mão de um ponto previamente gravado no gps e traçar uma reta até ele para não ficar varando mato em várias tentativas sem sucesso. Assim, ao sair da calha do córrego seco procurei algum caminho orientado pela direção apontada pelo aparelhinho. Depois de vários enroscos e espinhos, encontrei algo que parecia ser uma tênue trilha que subiu, passou por outra água parada (mas limpa) e saiu da floresta às 8h53 exatamente na língua de mato que dá acesso ao cume - ufa!

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Vale do Rio Vargem do Braço

Mas ainda faltava vencer um desnível bastante íngreme de quase 100m sem uma trilha bem definida, o que me matou logo cedo. Após subir com cuidado algumas lajes de pedra inclinadas e altas quase no topo, alcancei finalmente o cume do Pico do Tabuleiro às 9h38, confirmando seus 1249m de altitude.

Explorei as bordas do grande platô para registrar a espetacular paisagem e caminhei (por trilha bem definida) até a ponta sudoeste para uma visão do caminho percorrido desde o Morro das Pedras, ainda no primeiro dia da travessia. A noroeste, é possível ver os carros passando na BR-282, rodovia pela qual vim de Floripa, e o posto Ipiranga do trevo de São Bonifácio. A nota negativa ficou por conta do lixo deixado pelos farofeiros que acampam numa grande clareira a oeste do cume, exatamente onde chega a trilha que sobe de Caldas da Imperatriz.

Deixei o cume às 10h53 por essa trilha e levei bem mais tempo do que imaginava para chegar a Caldas: 3h40. A trilha, ao contrário do que havia lido, é bem aberta e marcada, sem nenhuma dúvida. O que acontece é que em alguns trechos os bambuzinhos projetam as folhas no caminho, raspando nos braços. De novo uma manga longa vai bem.

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BR-282 vista do Pico do Tabuleiro

A descida é toda feita na sombra da mata e é bem íngreme no começo, perdendo altitude rapidamente. Há duas pequenas clareiras que servem como mirante (uma na cota de 986m e a outra na de 857m), mas em outros momentos também é possível ver entre o arvoredo a grande muralha do Pico do Tabuleiro ficando para trás. Às 14h, aos 439m, cruzei um pequeno curso-d'água que pode molhar a goela seca mas não parei pois topei com uma cobra marrom clara de tamanho médio bem ao lado (e eu ainda tinha água de reserva). Mais 13 minutos e aparece um casebre de madeira deserto no meio do nada com placa de "Sítio Orgânico Montanha do Tabuleiro". Após uma plantação de eucaliptos desemboco numa outra trilha e vou para a direita. Essa vai se transformando numa estradinha precária até terminar às 14h32 numa rua concretada de um bairro, exatamente onde um pé de mexerica carregado me convida a adoçar a boca.

Dali bastou tomar à esquerda a rua concretada (que se assemelha a uma rua particular) e descer até a rua principal, onde há um portal de concreto com o número 2479 e um ponto de ônibus de cada lado. Altitude de 163m. Em poucos minutos tomei do outro lado da rua o circular Floripa-Caldas da Imperatriz que saiu do ponto final ali próximo às 15h15. Esse ônibus tem ponto inicial na plataforma 1 do mesmo terminal da Praça 15 onde tomei o ônibus São Bonifácio alguns dias antes.

Nesse dia caminhei 7,8km.
Total da caminhada: 33,2km

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Pico do Tabuleiro visto da descida para Caldas da Imperatriz

Informações adicionais:

O site oficial do parque é www.fatma.sc.gov.br/conteudo/parque-estadual-da-serra-do-tabuleiro.

Horários de ônibus:
O nome oficial do terminal da Praça 15 é Terminal Urbano Cidade de Florianópolis.

. Floripa-São Bonifácio (empresa TCL - www.transportescapivari.com.br) - plataforma 5 do terminal da Praça 15  - R$16,25:
seg a sáb - 12h10 e 17h50
dom e feriados - 17h50

. Floripa-Caldas da Imperatriz (empresa Imperatriz) - plataforma 1 do terminal da Praça 15 - R$5,40:
consultar o site www.avimperatriz.com.br

Cartas topográficas:
. São Bonifácio - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-3.jpg.
. Santo Amaro da Imperatriz - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SG-22-Z-D-V-1.jpg

Rafael Santiago
maio/2013

Percurso na imagem do Google Earth - parte 1
Percurso na carta topográfica - parte 1
Percurso na imagem do Google Earth - parte 2
Percurso na carta topográfica - parte 2