Vista do Alto do Condado para a Serra do Papagaio
As fotos estão em https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TravessiaItamonteAlagoaViaPedraDoPicuESerraDosBorgesMGFev15.
1º DIA: DO ENGENHO DA SERRA AO MIRANTE DA VARGEM GRANDE
Esta viagem já começou com um atraso considerável por causa da saída caótica do feriado de carnaval. Após uma espera de 2 horas o Cometa partiu enfim à 1h30 com destino a Caxambu, mas eu saltei às 6h na rodoviária de Itanhandu, segunda cidade depois da divisa SP-MG. O táxi que eu havia fechado para me pegar ali não apareceu, então resolvi esperar até 7h15 e pegar o primeiro ônibus da empresa Cidade do Aço para Itamonte, onde tomei um táxi até o bairro Engenho da Serra pois não há ônibus (preço combinado R$25). Saltei em frente ao casarão colonial do bairro, ajeitei a mochila, amarrei direito as botas e dei início à caminhada às 9h06 adentrando um portão de ferro em frente ao casarão que dá acesso à trilha da Pedra do Picu. Altitude de 1260m. Num minuto passo por uma bica, mas não é preciso se preocupar com água pois haverá mais fontes (mais confiáveis até) pelo caminho. Contorno um curral pela esquerda e subo pela trilha no pasto. Ao se aproximar da mata acima a trilha some por alguns metros mas é só seguir uma valeta que rasga o pasto na direção de uma abertura na mata à esquerda. Às 9h23 entro na sombra dessa mata e dela só sairei ao chegar ao mirante do Picu. O primeiro ponto de água esperado está seco porém os três seguintes abastecem meus cantis com fartura.
A caminhada na mata estava fácil demais, com pouco desnível, mas havia que subir muito até a crista em que desponta a enorme pedra. Na cota dos 1630m a trilha embicou de vez para o alto e a tração da bota teve um grande teste no chão um pouco enlameado. Nos 1884m, às 10h33, uma bifurcação: ambos os lados levam à parede da pedra, já muito próxima. Optei pela esquerda e alcancei em 8 minutos uma outra trilha. À direita, com mais 30 metros já podia tocar a enorme parede rochosa do Picu, na altitude de 1939m. Mas o mirante estaria à esquerda dessa última bifurcação, portanto retornei, passei pela clareira de acampamento e subi alguns metros até o maciço que proporciona ótima vista da pedra e dos arredores. O bairro do Engenho da Serra já está bem abaixo a sudoeste; Itamonte e Itanhandu bem distantes a noroeste. Fiz um lanche ali e saí às 11h26.
Voltei para dentro da mata, retornei à parede do Picu e continuei pela trilha à esquerda dela, que imediatamente começa a descer. Após uns 40m não notei uma variante saindo para a esquerda e continuei descendo em frente, mas logo esta trilha começa a ficar mal definida. Voltei e tomei a outra (agora à direita), que se mostrou mais marcada, até com algumas fitas vermelhas nas árvores. Na primeira bifurcação em T fui para a direita pois a esquerda subia de volta. Na segunda bifurcação em T (1819m) tomei a direita novamente já que a esquerda me levaria ao bairro da Fazenda Velha. Meu objetivo nesse dia era alcançar a estrada de terra que vai do Brejo da Lapa à Vargem Grande para logo em seguida tomar as trilhas que levam à Serra da Cachoeira e ao bairro do Campo Redondo.
A partir dessa última bifurcação em T essa trilha era desconhecida para mim e bastante inexplorada, com possibilidade de estar fechada por falta de uso. No começo tive alguma dificuldade para avançar por causa das taquarinhas e galhos atravessando o caminho, mas a trilha estava bem nítida no chão. Me enrosquei bastante, rastejei em alguns momentos, mas depois o caminho foi se abrindo e o caminhar foi se tornando mais fácil e rápido. Ao alcançar uma laje inclinada e molhada, às 12h32, bastou seguir em frente com cuidado para reencontrar a trilha em poucos metros.
Pedra do Picu
Ao cruzar os primeiros pontos de água, afluentes do Rio das Furnas (segundo a carta do IBGE), estava entrando nos limites do Parque Nacional do Itatiaia. Após o segundo riacho inicio uma longa e suave subida, mas antes olho para trás e ainda vejo entre as árvores a enorme pedra em forma de barbatana do Picu. Às 13h34 mais um afluente do Rio das Furnas e após 22 minutos saio um pouco da mata e atravesso uma grande clareira com um outro riacho. Depois dele uma laje de pedra causou alguma dúvida mas o certo é subi-la para a esquerda para retomar a trilha no sentido nordeste, voltando para dentro da mata. Nessa hora desabou uma tempestade com raios e preferi estar mesmo na mata a estar exposto em algum lugar alto e descampado.
Às 14h24 cruzei mais um riacho e verifiquei na carta que já estava bem próximo das nascentes do Rio das Furnas e também do ponto mais alto da caminhada de hoje. Numa bifurcação 4 minutos depois fui à esquerda pois a direita leva a um córrego apenas. E finalmente às 14h37 cruzo uma tronqueira aberta que marca aos 2070m o início da descida para a outra vertente dessa serra. Parece que meu objetivo será mesmo alcançado!
Após atravessar seis córregos (alguns bem cheios por causa da chuvarada), todos afluentes do Ribeirão da Vargem Grande, e passar por um curral vazio do lado direito, foi preciso atravessar às 15h55 o próprio Ribeirão da Vargem Grande, com bastante cuidado por causa da correnteza. Nem tive o trabalho de tirar as botas pois estavam ensopadas com a chuva forte. Daí em diante caminharia os cinco dias com elas úmidas ou molhadas por causa das chuvas seguintes.
Depois do Vargem Grande bastou seguir a trilha e em mais 6 minutos estava saindo da mata e atingindo a estrada Brejo da Lapa-Vargem Grande, como planejado. Essa saída tem duas opções: seguindo sempre em frente é preciso atravessar duas cercas para sair na estrada; tomando uma bifurcação que sobe à direita não é preciso cruzar nenhuma cerca mas o percurso é bem maior do que o primeiro.
Uma vez na estrada caminhei para a esquerda, passei pela Pousada dos Lobos e com mais 240m entrei numa tronqueira à esquerda que dá acesso a um campo. Cruzei o Vargem Grande novamente, mas desta vez por uma ponte de madeira (ufa!) e comecei a subir pela trilha larga, erodida e cheia de pedras.
Por sorte nessa subida encontrei uma fonte de água limpa pois com a chuva todos aqueles riachos lá atrás estavam com a água marrom, sem condições de consumo. Essa trilha desembocou numa outra e subi mais 30 metros para, às 17h33, chegar a uma bifurcação importante: a esquerda leva de volta à Fazenda Velha como parte da clássica travessia Mauá-Itamonte e a direita me leva ao meu próximo objetivo, a Serra da Cachoeira.
Mais 80m saio da mata e passo a caminhar por uma crista. Ao entrar num novo trecho de mata surge uma outra bifurcação: o caminho da direita desce diretamente ao bairro da Vargem Grande, portanto continuo à esquerda e me mantenho no alto. Em mais 20min saio da mata e às 18h26 chego a um espetacular mirante para as montanhas de Itatiaia com a Vargem Grande aos seus pés. A nordeste, no horizonte, as serras e montanhas de Alagoa, como Mitra do Bispo, Serra do Ouro Fala e Serra dos Borges e do Condado, meu destino ainda nessa travessia.
Pelo horário e pelo cansaço do dia e da viagem, resolvi improvisar um acampamento ali mesmo no mirante. Assim o dia seguinte começaria com uma linda paisagem. Altitude de 2039m.
Uma curiosidade: nesse local eu estava saindo dos limites do Parque Nacional do Itatiaia e entrando nos do Parque Estadual do Papagaio já que os dois são contíguos.
Bairro da Vargem Grande e montanhas de Itatiaia encobertas de manhã
2º DIA: DO MIRANTE DA VARGEM GRANDE À DIVISA ITAMONTE-ALAGOA
Choveu ao amanhecer, o que, juntamente com o frio, me segurou mais tempo no saco de dormir e me atrasou o início da caminhada. Parti bem tarde, às 10h26. Logo entrei num trecho de mata, cruzei uma tronqueira e ao sair me mantive à esquerda para reencontrar a trilha que se tornara mal definida no capim baixo. Às 10h58 uma bifurcação não muito óbvia: o caminho mais marcado e aberto segue para a esquerda (oeste) porém me levaria ao mirante do Alto da Boa Vista, onde já estive em outras oportunidades; em frente uma trilha mais apagada seria o meu caminho desta vez. Detalhe: esse foi o ponto mais alto da caminhada desse dia (2040m).
Na descida a trilha foi se definindo, passei por um cocho e me aproximei de um riacho à esquerda. A trilha continuava bem marcada pela encosta do morrote à direita mas se afastava do riacho e eu deveria na verdade atravessá-lo. Abandonei-a portanto e na procura de um local onde o curso de água fosse mais estreito acabei cruzando-o num único passo. Aproveitei para encher o cantil com água límpida. Na outra margem um gramadinho com restos de fogueira. Retomei a trilha que me levou a outro ribeirão, o qual atravessei em alguns saltos. Essas águas abastecem lá embaixo no vale o Córrego João Vieira, que por sua vez deságua no Rio Aiuruoca próximo do bairro da Fragária.
Subi a encosta pela trilha erodida e às 11h58 notei uma outra vindo da esquerda (que me levaria também ao Alto da Boa Vista ou ao Alto dos Costas), mas a trilha em que eu estava me levou mesmo para a direita, para a crista denominada Serra da Cachoeira na carta, que se estende no sentido nordeste. Aqui o caminho se tornou ainda mais bonito e agradável, com vista para as serras e montanhas de toda a região e a primeira visão do Pico do Papagaio e do Campo Redondo, bairro que alcançaria em breve, além do bairro da Fragária e do Rio Aiuruoca à direita (oeste).
Às 13h09 cheguei à extremidade dessa serra, local denominado Pico do Peão, com 1938m de altitude. Ali a quina de uma cerca sugere que se desça a serra para a esquerda (norte) ou para a frente (leste). Analisei os possíveis caminhos mais abaixo e optei por seguir em frente, com a cerca à minha esquerda, mas a descida íngreme e o terreno ruim me fizeram passar para o outro lado dela. Só reencontrei a trilha mais abaixo, mas ela logo morreu numa cerca, que cruzei por baixo. Continuei pelo pasto e atravessei mais duas cercas, sempre me mantendo na crista (descendente) e acompanhando uma cerca à direita. Às 14h14 me deparei com uma trilha bem marcada e uma tronqueira à direita, mas fui para a esquerda, desci até um curral com vacas e alcancei um caminho mais largo que desembocou numa porteira de arame e uma estrada de terra. Essa é a estrada que liga o Campo Redondo (esquerda) à Fragária (direita). Altitude de 1585m.
Fui para a esquerda e imediatamente atravessei a ponte sobre o Córrego da Cachoeira, que alguns metros à direita despenca na belíssima Cachoeira da Fragária, não visível ainda. Foi preciso subir 600m pela estrada para poder contemplá-la e fotografá-la depois de muitos anos. Às 15h cheguei enfim ao Campo Redondo e quis ver de perto a singela igrejinha do arraial. Logo me pus na estrada novamente (na direção de Itamonte) e decidi ir para o bairro Monte Belo utilizando mais trilhas do que estradas (apesar de ser um caminho 1km mais longo). Assim, tomei a esquerda na primeira bifurcação (à direita para o bairro Capivara) e novamente a esquerda na segunda, na qual iria para Monte Belo por estradas à direita. Tive de subir até um selado acima marcado por araucárias, exatamente numa curva para a esquerda em que a estrada começa a descer para o vale do Córrego da Berta. Junto à curva uma tronqueira à direita dá acesso a uma trilha larga, na qual entrei às 15h42. Essa trilha segue mais ou menos em nível pela encosta do morro, cruza quatro tronqueiras, depois uma cerca com um curral abaixo à esquerda (e várias vacas), mais duas tronqueiras e alcança um aceiro vindo do alto à direita. Esse aceiro me confundiu um pouco pois tentei descer por ele, mas a direção não era a desejada; subi de volta e encontrei a trilha certa, continuação da anterior, que na verdade cruza o aceiro.
Cachoeira da Fragária e Pico do Peão
Entrei num trecho de mata em que a trilha continuava nítida e ao sair dele às 16h38 encontrei um pequeno lago onde pude repor os cantis na água despejada por uma mangueira. Continuando, cheguei a uma outra trilha, a qual tomei para a direita. Estranho foi perceber que todas as cercas por ali eram elétricas!? Às 16h53 atravessei uma porteira de arame que me lançou ao final de uma estrada. Mais 18 minutos (e outra porteira de arame) chego a uma estrada de terra com marcas de pneus e a grande porteira de uma fazenda à direita, com a casa visível dali. Mas meu caminho era descendo à esquerda. Nessa hora a chuva nossa de todo dia chegou com tudo e fez a gentileza de molhar a minha bota novamente. Pelo menos dessa vez não teve raios.
Às 17h48 atinjo a estrada principal, que liga Itamonte a Monte Belo, e vou para a direita. Na bifurcação atravesso à esquerda a ponte sobre o Rio Aiuruoca e chego às 18h ao pequeno bairro de Monte Belo, cujo "centro" se resume a uma igreja, uma escola, um posto de saúde e um bar, de onde todos me olham com espanto e curiosidade (um sujeito andando sozinho na chuva com uma capa e uma grande corcunda em pleno carnaval...). Altitude de 1297m. Na bifurcação com placa subo à esquerda na direção do bairro Dois Irmãos e Bocaina de Minas (à direita iria para o bairro Capivara), mas após 500m abandono essa estrada e tomo uma mais precária à esquerda que desce até uma ponte de madeira sobre o Ribeirão dos Dois Irmãos. Após a ponte e a porteira a seguir a estrada vira uma trilha, ou melhor, uma canaleta bastante enlameada e escorregadia. Às 18h29 surge um pequeno lago à direita que verte suas águas na trilha. Depois de subir bastante, ela estabiliza onde há um curral cercado à direita com água próxima. Subindo mais um pouco noto uma bica de água à direita que despeja num reservatório feito de alvenaria. Peguei dessa água e não tive problema, apesar da presença do gado. Mais 150m atinjo às 18h58 o ponto mais alto de um selado com um cercado de madeira e uma porteira. Dali em diante começaria a descida em direção ao vale do Rio Aiuruoca e depois ao bairro Itaoca. Decidi pernoitar ali mesmo, com bastante espaço plano e gramado para montar a barraca. O único problema é que eu percebi mais tarde que estava bem no caminho das vacas. Altitude de 1449m.
Em tempo: essa crista em que eu estava é o exato limite entre os municípios de Itamonte e Alagoa.
3º DIA: DA DIVISA ITAMONTE-ALAGOA AO ALTO DOS BORGES
Nesse terceiro dia de travessia, assim como no primeiro, havia dúvida quanto às condições da trilha e melhor trajeto a seguir pois não encontrei nenhum relato de caminhada pela Serra dos Borges e Serra do Condado. O que eu tinha era um traçado feito sobre as imagens do Google Earth e a ciência de que vários trechos da crista dessas serras eram recobertos de mata, o que deixava no ar a dúvida se seriam transitáveis ou não.
Antes de mais nada é muito importante dizer que o alto dessas serras não tem nenhum ponto de água, portanto é preciso abastecer os cantis nos pontos de água citados anteriormente, o necessário para dois dias de caminhada (três dias no meu caso).
No local onde acampei eu já estava na crista, faltava encontrar a trilha que me levasse para o alto através da mata à minha direita (leste). Sem nenhuma informação, gastei bastante tempo para encontrar um bom caminho (nem digo que foi o melhor caminho). Resumindo: procurei e encontrei uma trilha que percorreu a mata na direção pretendida, mas ela sumiu de repente. Voltei e continuei pela trilha do dia anterior, descendo bastante na direção do Rio Aiuruoca até um ponto onde a encosta da serra passou a ser de pasto com condições de subida. Só no alto é que encontrei uma trilha vindo da direita, segui-a e ela se juntou à primeira que eu havia tentado, mas essa ligação era imperceptível.
Primeiros cumes da Serra dos Borges
Agora que resumi toda essa exploração, vamos ao caminho certo: do ponto de acampamento junto à porteira não se deve descer para o vale do Rio Aiuruoca e sim subir a encosta de capim à direita (leste) até a borda da mata, entrando na trilha bem aberta e marcada. Logo aparecerá uma cerca à direita mas a trilha rapidamente se afasta dela. Porém há um ponto em que é preciso entrar na mata à direita e voltar a essa cerca (esse ponto é impossível descrever, não há nenhuma indicação, e a curta picada está quase fechando). Uma vez na cerca basta tocar para cima (esquerda) acompanhando-a pelo lado que estiver mais limpo e desimpedido. Ela está exatamente na crista da serra, porém ao sair da mata ela bordeja pela esquerda o primeiro morrote, marcado na carta com 1685m.
Pois bem, estou finalmente na crista dessa longa serra (aproximadamente 12km) que tem pelo menos dois nomes, Serra dos Borges e Serra do Condado (talvez haja outros nomes locais dados pelos moradores mas não tive essa informação). A sequência de sobe-e-desce na direção geral oeste-leste me levará para pontos cada vez mais altos dessa serra e a visão do horizonte em 360º será a recompensa por todo o esforço para chegar aqui. O ponto mais alto de toda essa crista é o Alto do Condado com 2152m (2212m na carta) mas nesse dia consegui chegar aos 2049m, local marcado na carta como Alto dos Borges (com 2052m).
Essa crista, como já mencionei, marca o limite entre três municípios mineiros. Nesse trecho inicial, que chamam de Serra dos Borges, ela é o limite entre Itamonte (ao sul) e Alagoa (ao norte). A partir de uma elevação denominada na carta como Alto da Paraíba a mesma crista passa a se chamar Serra do Condado e é o limite entre Bocaina de Minas (sul) e Alagoa (norte). Se algum conhecedor da região discordar dessas informações, por favor me diga para eu corrigir.
De forma geral terei até o fim do dia a mata fechada do meu lado direito e o pasto à minha esquerda, com alguns trechos de mata fáceis de transpor. No dia seguinte teria um panorama parecido porém os trechos de mata foram se tornando cada vez mais fechados até a trilha virar um verdadeiro vara-mato e desaparecer.
Bem, voltando à trilha... ao contornar o morrote de 1685m surge uma outra trilha vindo lá de baixo, da esquerda (provavelmente de um curral que eu avistara). Chego às 13h51 a um colo entre as duas primeiras elevações da crista, onde encontro uma tronqueira e uma trilha larga do outro lado entrando na mata e descendo a serra na direção de Monte Belo. Esse devia ser um caminho ainda melhor, mais curto e aparentemente mais aberto, mas cujo acesso passou despercebido no dia anterior (depois olhando com mais atenção a carta vi que esse caminho está indicado...).
Após uma parada para lanche é hora de subir (14h30). E logo começam a aparecer as inúmeras cercas a cruzar, sendo a primeira novinha em folha, com o arame farpado ainda brilhando (não mencionarei todas as cercas que cruzei pela frente pois foram muitas). Depois de atravessar um curto trecho de mata, atinjo o primeiro cume (1758m), com mata e repleto de "dejetos bovinos". Às 15h10 alcanço um outro cume que proporciona visão dos cumes seguintes, marcado na carta com 1804m (1811m no gps). Uma suave descida me leva a atravessar um trecho de mata de 150m por trilha de vacas e subir em seguida acompanhando os paus de uma antiga cerca, onde encontro as mimosas que circulam por toda essa área (e mantêm as trilhas abertas). O próximo cume está registrado na carta com 1857m e bate exatamente com a marcação do gps. Contorno a sua mata pela direita, desço um pouco e às 16h13 entro na mata. Logo depois de uma árvore atravessada na trilha sigo para a esquerda e saio logo para o campo aberto, mas me mantenho nas trilhas mais próximas da mata para não perder altitude e acompanhar a crista ascendente.
Às 17h22 alcanço um dos mais bonitos cumes dessa travessia, com visão ampla em todas as direções, aos 1979m de altitude (1986m na carta). Alagoa e o Pico do Papagaio estão ao norte, Mitra do Bispo e Serra do Ouro Fala a nordeste, Monte Belo a sudoeste e nessa mesma direção, bem mais longe, o Campo Redondo e o Pico do Peão. Ótimo local para uma pausa para descanso e lanche.
Vale do Rio Aiuruoca na direção de Itatiaia
Continuo na direção leste e ao cruzar uma pequena faixa de mata na parte mais baixa me deparo às 18h com uma vala funda e camuflada pela vegetação de forma que poderia causar um acidente. Noto que ela é extensa para a esquerda (norte) e uma trilha a acompanha até onde consigo ver (mal sabia que essa seria minha rota de fuga quando não consegui ultrapassar a mata fechada no dia seguinte e a neblina me impediu de visualizar outro caminho de descida). Uns 300m depois da vala noto que a trilha está desviando da crista pois passo a caminhar na encosta do morrote à direita. Trato então de subi-lo sem trilha e descer do outro lado sem me afastar da mata à direita e sem sair da crista. Após uma curta faixa de mata a subida se torna mais longa acompanhando a cerca. Numa quina em que a cerca quebra 90º para a esquerda (de sudeste para nordeste) avisto a Pedra Selada de Visconde de Mauá. Às 19h05 alcanço o cume mais alto do dia, aos 2040m de altitude, denominado Alto dos Borges na carta (onde está registrado com 2052m).
Com o dia findando improvisei o acampamento numa pequena clareira na entrada da mata que recobre o cume já que todo o terreno ao redor é inclinado. À noite pude avistar as luzes de Alagoa ao norte e do Campo Redondo bem mais distante, a sudoeste.
4º DIA: DO ALTO DOS BORGES A UM LUGAR QUALQUER NA CRISTA
Resumindo esse dia: descobri depois de muito vara-mato que não conseguiria completar a travessia da serra até seu final pois a vegetação fechou a trilha numa parte da crista em que a mata densa a recobre completamente, sem possibilidade de caminhar por pasto ou capim baixo. Fui obrigado a voltar e improvisar uma descida em direção a Alagoa (norte).
O dia amanheceu com uma forte neblina e eu dependia bastante da navegação visual para traçar o caminho à frente. Enrolei algum tempo na barraca mas a neblina só dissipou perto das 10h. Desmontei tudo (sob o olhar de curiosas vacas que surgiram do nada) e parti às 10h52 ainda na direção leste na tentativa de concluir a travessia da crista inteira. Pura ilusão...
Após descer um pouco entrei na mata e caminhei por ela algum tempo, mas resolvi sair para o campo à esquerda quando a enroscação na mochila começou a me segurar demais. Às 12h17 alcancei o próximo cume, de 2130m, sem nome na carta mas próximo de uma montanha denominada Alto da Paraíba, para a qual não encontrei trilha. Ali começa o limite entre os municípios de Alagoa (norte) e Bocaina de Minas (sul) e avista-se também a Pedra Selada de Mauá.
Desci na direção norte até um extenso vale gramado (ótimo local de acampamento) e segui a trilha mais 100m apenas, quando resolvi abandoná-la e subir a encosta de capim à direita para me manter na crista, exatamente no local onde há um tronco queimado. Segundo a carta passo a caminhar agora pela Serra do Condado. Encontrei uma outra trilha que me levou até um gramadão bom para acampar porém repleto de bosta de vaca. Continuei subindo por uma trilha mal definida até topar com uma cerca sem trilha do outro lado às 13h19. Percorri-a para a direita e encontrei uma trilha entrando na mata. Cerca de 400m depois cruzei outra cerca e vi que a trilha estava mais fechada e não pisada do outro lado (não encontrei mais bosta de vaca pela frente, o que mostra que dali em diante elas não transitam). Mais à frente saí da mata e segui uma trilha encoberta pela vegetação por 120m, quando reentrei na mata e achei uma trilha melhor. Percebi que estava numa crista estreita com visão dos dois lados através das árvores. Quando a vegetação se fechou de novo e começou a enroscar demais na mochila saí da mata para a esquerda e fora já estava melhor para caminhar. Subi um pouco e às 14h27 cheguei ao ponto culminante de toda essa longa crista, aos 2152m, denominado Alto do Condado na carta (onde aparece com 2212m). Sentei para descansar um pouco e estudar o caminho à frente pois a mata vem fechando cada vez mais e não há mais trilha óbvia como antes. O que avistei não foi muito animador: a crista à frente totalmente recoberta de mata alta, sem campo ou pasto nas laterais para tentar avançar no caso de a trilha se fechar.
Vista do Alto do Condado para a continuação da crista (e Mitra do Bispo à esquerda)
Desci do Alto do Condado sem trilha na direção nordeste até um pequeno vale abaixo (onde acabei acampando no retorno ao fim do dia), subi um pouco e continuei pela crista à direita (leste) por vestígios de trilha que me levaram a entrar na mata novamente às 15h44. Mas esta foi a última pois lá dentro só consegui avançar com muita insistência e me enroscando todo num total vara-mato. Havia uma antiga trilha ainda no chão mas o mato fechou completamente, com inúmeras taquarinhas atravessadas. Procurei por alguma outra trilha para os lados mas não encontrei. Às 16h37 dei por encerrada a exploração e resolvi retornar e procurar alguma outra saída na direção de Alagoa (norte).
Não vale a pena descrever as rotas de fuga que tentei e foram infrutíferas. O que posso dizer é que até o fim do dia não encontrei uma forma de descer, sempre barrado por matas sem trilha. Para completar, veio a chuva nossa de todo dia junto com uma neblina forte. Às 19h45 improvisei um acampamento precário no local mencionado anteriormente. Como a minha água já estava no fim e lá fora ela caía em abundância, usei uma vasilha de plástico para coletar e ter um pouco para o lanche da noite e o café da manhã.
5º DIA: DE UM LUGAR QUALQUER NA CRISTA A ALAGOA
O dia amanheceu com chuva, vento forte e neblina total, visibilidade de menos de 50m. A dificuldade de encontrar a rota de fuga aumentou ainda mais dessa forma. Saí da barraca nessas condições maravilhosas às 9h02 e procurei um caminho nos arredores. Não encontrando subi de volta ao Alto do Condado (9h37) e voltei pelo mesmo caminho do dia anterior, com todas as dificuldades de atravessar o longo trecho de mata. Continuei até o tronco queimado de ontem e tomei a trilha abaixo dele para a direita, inicialmente bem marcada, porém logo sumiu. A neblina me impedia de visualizar alguma crista que pudesse me levar para baixo de forma desimpedida. Continuei então o retorno. Ao passar pelo Alto dos Borges (12h30) tentei uma outra trilha bem marcada mas desapareceu de uma hora para outra também.
Às 13h02 cheguei ao local no qual depositava todas as esperanças: a vala profunda com trilha paralela. Mesmo sem conseguir ver para onde ela me levaria (por causa da neblina), tomei a trilha para a direita com fé. Altitude de 1954m. A tal vala foi me parecendo um antigo aqueduto, não sei se estou certo. Segui junto a ela, cruzei uma cerca e encontrei às 13h19 uma trilha mais batida, na qual fui para a direita, descendo. Logo me deparei com um riacho, a primeira água desde o início do terceiro dia de caminhada. Cruzei uma cerca e a trilha me levou a atravessar esse riacho (afluente do Córrego da Itaoca) num ponto mais abaixo, onde há um curral (com vacas). A trilha segue para a esquerda sem entrar no cercado do curral.
Às 14h12 me aproximo dos alicerces de pedra de alguma casa que deve ter pertencido à Fazenda dos Borges (conclusão tirada da denominação dada na carta do IBGE). Mais 10 minutos de descida e cruzo uma porteira e a ponte sobre o Córrego da Itaoca, com uma pequena cachoeira à direita e à esquerda o encontro do riacho que vinha acompanhando com o Itaoca. Sigo descendo pela trilha mais batida, cruzo uma porteira com visão de uma casa à esquerda e às 14h55 a trilha termina numa estrada que à esquerda dá acesso ao sítio avistado. Estou no bairro chamado Serra dos Borges, altitude de 1439m. A estrada desce até a ponte sobre o Córrego da Itaoca e uma porteira de ferro, depois sobe e logo desce novamente, passando pelo bairro do Paiolzinho (com uma igreja à esquerda) e chegando às margens do Rio Aiuruoca. O local chamado de Corredeiras da Itaoca na verdade é um trecho mais agitado do Rio Aiuruoca, com pequenas quedas e uma cachoeira. Às 16h47 passo pelo bairro Itaoca, tomo a esquerda na bifurcação, cruzo o Rio Aiuruoca e começo a subir. Por sugestão de um morador, peguei um atalho: antes do ponto mais alto dessa subida entro num quebra-corpo à direita e vou na direção da fileira de árvores no alto contornando uma roça de milho pela esquerda; ultrapassadas as árvores vem a descida pelo pasto para a estrada (de asfalto) que liga Alagoa a Itamonte, aonde cheguei às 17h32 (esse atalho dispensa a passagem pelo bairro Prateado). Peguei o asfalto para a direita e para minha "sorte" a chuva voltou com força total, molhando a bota novamente, só para eu viajar de volta com o pé molhado - raios triplos! Às 18h14 cheguei à entrada de Alagoa (altitude de 1135m) e 3 minutos depois à Pousada Pica-pau, onde finalmente tomaria um banho quente.
Distância total percorrida: 55,8km (descontadas as explorações e os erros).
Vista do Alto do Condado para a Serra do Ouro Fala, Mitra do Bispo e Pedra do Juquinha abaixo
Informações adicionais:
A linha São Paulo-Itanhandu é operada pela Cometa: http://www.viacaocometa.com.br
Horários do ônibus Itanhandu-Itamonte:
empresa Cidade do Aço:
7h15, 11h30, 15h15, 17h45, 21h15, 22h10
empresa Delfim:
6h45 (seg a sex), 9h, 10h30, 13h15, 14h45, 15h50 (seg a sáb), 17h (seg a sex), 17h20 (dom), 18h30
Horários do ônibus Itamonte-Itanhandu:
empresa Cidade do Aço:
5h50, 7h40, 9h10, 12h, 14h25, 16h20, 18h25, 22h10
empresa Delfim:
6h (seg a sex), 7h35, 10h, 11h45, 13h50, 15h20 (seg a sáb), 16h20 (dom), 16h30 (seg a sex), 18h
Horários do ônibus Itamonte-Alagoa:
seg a sáb - 14h
dom - 14h30
Alagoa-Itamonte:
seg a sáb - 6h
dom - 13h
Cartas topográficas:
Passa Quatro - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-A-I-3.jpg
Agulhas Negras - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-A-I-4.jpg
Alagoa - http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/mapas/GEBIS%20-%20RJ/SF-23-Z-A-I-2.jpg
Rafael Santiago
fevereiro/2015
Percurso na imagem do Google Earth - parte 1 (clique sobre a imagem para ampliá-la) |
Percurso na carta topográfica - parte 1 |
Percurso na imagem do Google Earth - parte 2 |
Percurso na carta topográfica - parte 2 |
Percurso na imagem do Google Earth - parte 3 |
Percurso na carta topográfica - parte 3 |
Percurso na imagem do Google Earth - parte 4 |
Percurso na carta topográfica - parte 4 |
Percurso na imagem do Google Earth - parte 5 |
Percurso na carta topográfica - parte 5 |